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encaixotados

Queria ter participado da reunião de valores morais dos tempos modernos, exatamente no momento em que acreditaram que era coerente se manter imóvel e exigir mudança. Mesclando a sensação de impotência recheada de dúvidas. Ancorado na tristeza, estático, aguardando de maneira nobre que a minha energia se desfaça aos poucos. Um pouco no controle da televisão. Um tanto na tela do celular. Rouco de silêncio, vejo minha expressividade coibida pelo medo do novo. Da proximidade, da imbecilidade. Da governabilidade da intolerância. Expansivo sempre fui. Atrapalhado além da conta.

Um elefante de quarentena numa loja de cristais.

Vejo em cada esbarrar do meu caminhar truculento, que talvez eu não tenha desaprendido, mas posso ter optado por esquecer. Reposicionei minhas frustrações dentro das minhas camadas de carisma. Abracei o mundo com o mesmo calor com a qual eu fui chutado em meus piores momentos. Ignorei minha ferida e acreditei que fosse humanamente possível trocar a roda do carro em movimento. E a obviedade tem uma maneira nada sútil de escancarar cicatrizes que o tempo ajudou a esquecer.

Seguimos descrevendo momentos irrelevantes com trilhas amorosas, fantasiando saudades invisíveis em corações desconhecidos. Por mais alta e longa que seja a trajetória de um avião, é necessário um espaço para o pouso. Outro pedaço de terra para que se possa descansar. Suspirando em segurança, por uma lembrança do instante que já faz parte de um passado. Adrenalina repousando no mesmo espaço que a ansiedade. Um permanente estado de alerta que educa e doutrina. Somos o que consumimos, mas nos perdemos nos rótulos pois eles nunca foram lidos. De produtos e pessoas.

Inesquecível passou a ser a palavra mais valorizada em mundo as pessoas não sabem o próprio número de telefone. Projetamos nossas dores em ombro de amores. Questionamos nossa felicidade enquanto seguimos nossa caminhada. Precisamos comprar. Precisamos mudar. Precisamos comer. O evoluído mascarado ainda olha torto para quem lhe pede comida e é contra a cota. Desacreditado do tamanho que a própria palavra lhe enforca. Bem vindos ao vale da arrogância baseada no achismo.

A desconstrução do novo mundo vai deixar mágoas, nas sensíveis aos sensitivos. Entretanto, são das lágrimas que teremos como engrenagem das novas máquinas. O tal pedaço de terra nunca foi teu. Quando foi nosso, já não era deles. Demarcados por proprietários autoproclamados. Herdeiros fogosos. Abastados pelo sangue alheio. Julgando o belo que canta suas lamúrias para a lua, por ser desprovido de um padrão de beleza. O barão que tanto maltratou a baronesa, usurpou a esperança de quem lhe servia e queimou o que não era seu. Mas foi um ótimo avô. Separemos o autor da obra. Pelo menos no nosso álbum da família.

Ariscos e incomodados. Subversivos e amedrontados, mas conectados de uma forma como nunca antes estivemos. Como sapatos novos, que guardados, aguardam o momento de serem pisados. Incomodados, com as poesias que não lemos e os amores que perdemos. Felinos encaixotados. Desesperados para cruzar com o novo. Fugir da caixa. Mijar em muretas, conversar com a lua. Sumir pela rua. Renascendo quantas vezes for necessário nas incontáveis-sete-mortes que temos nessa vida e caindo em pé.

O futuro que você acreditou que nunca fosse chegar bateu na tua porta.

Você precisa de rótulos que não lidos ou de números que não são lembrados?

Abre a mente. E a porta. Voltamos.

1 resposta em “encaixotados”

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