tráfego lento.

Ela era uma jovem, que se dizia cansada de tudo que já tinha passado. Que estava malandreada da vida, que algumas atitudes do mundo já não iludiam mais a cabeça dela. Era uma mulher tão segura do seu rumo, que parecia que nenhum problema no seu caminho parecia alterar o tempo de sua viagem, sabia sempre onde virar antes ou brecar longe do perigo. Como se além de evitar qualquer contratempo no caminho, parecesse que ela sabia aonde poderia encontrar um congestionamento. Era realmente difícil de surpreender aqueles olhos castanhos que seguiam acima do volante, por toda aquela velha e conhecida estrada. Sabia perfeitamente desviar antes que qualquer buraco a fizesse trepidar, tinha contado cada centavo para cada pedágio e não se irritava com congestionamento já há alguns anos.

Ela era uma jovem, que não parava no acostamento. Por maiores fossem as suas desventuras nas rodovias da vida, sempre teve a sorte de seu veículo nunca dar problema. Mas vira e mexe, quando o sol batia contra sua lataria acinzentada, era possível ver alguns pequenos arranhões, algumas batidas que pareciam ter sido melhoradas. Algumas estacionadas sem olhar pra trás com tanto carinho, alguém que passou falando algo que não devia e tomou a sua atenção e acabou levando um pequeno pedaço. Mas nada que acontecesse recentemente. Tudo apenas antigas marcas que não pareciam atrapalhar. Apenas passavam suas experiências para os veículos ao seu redor. Era bacana como tratava os avisos e sinais na sua vida. Então se dizia apta o suficiente de parar quando quisesse e seguir quando achasse conveniente. Chegava sempre no horário, mas um dia que entendesses que avisos são pra ser seguidos, talvez atrasasse demais.

Ela era uma jovem, que não pedia informação para algumas pessoas, que simplesmente preferia seguir alguns trajetos sem ter a total certeza do que estava fazendo do que parar para perguntar. Que ultrapassava pelo acostamento sem olhar para o lado, apenas rapidamente olhando para trás vendo se alguém a acompanhava. Gostava da atitude de ser seguida por algumas pessoas mesmo sem ser perguntada. Passava essa confiança de sempre saber o que estava fazendo e a segurança do que podia e não podia fazer. Ainda não havia sido parada, talvez não tivesse chegado a hora ou simplesmente não teve motivo.

Ela era uma jovem, que evitava sair na chuva. Pois na chuva os contratempos eram maiores. Ela odiava contratempos. Mas algumas coisas acontecessem com a gente, faça chuva ou faça sol. E de uns tempos pra cá, a gente não sabe o que o tempo quer, ou quando vai virar, de tanto que ele mesmo se contradiz. Ela saiu de casa com um sol forte que brilhava em seu retrovisor. Mas o céu se amontoava em nuvens negras no caminho da estrada que ela seguia. A chuva veio. A viagem foi ficando mais devagar. E nessas improbabilidades da vida o carro que vinha atrás não a viu. Simplesmente encostou. O barulho a assustou muito, mas o impacto não parecia ter sido tão grande. Olhando pelo retrovisor viu o carro que refletia era maior que o seu. Contra ao seu gosto teve que encostar e parar.

Ela era uma jovem, que já saiu do com um arsenal de ofensas. Mas foi interrompida pelo porte alto e os olhos pequenos que já lhe pediam desculpas e assumia o erro. Pensou em soltar todos os cachorros acumulados. Foi interrompida com um cartão, com o número da placa do carro já anotado em uma caneta preta e algumas palavras que diziam para não ficaram ali naquele acostamento por ser perigoso. Queria esbravejar, mas não tinha sido tão feio, alias nem tinha acontecido nada. Pegou o telefone, testou, viu que realmente era aquele. Recebeu uma mensagem minutos depois pedindo novas desculpas e dizendo que poderia até mesmo acompanhar durante o orçamento. Orgulhosa ignorou. Novamente procurada com ligações não deu resposta. E só respondeu com os dados para o pagamento. Foi prontamente atendida sem delongas. Se sentia poderosa por ter tomado as rédeas até mesmo do acaso.

Ela era jovem e achava que entendia da vida. Ele era jovem e só queria conversar e conhecer. Ela era vivida e o evitou. Ele tentou por mais algum tempo até que desistiu. Ele tentou a ajudar com o orçamento e tento convidar para um jantar. Foi grosseiramente respondido por tentar misturar as coisas. Ela se fechou pra ele como fechava os outros no trânsito. Ele deu farol ela ignorou. Ele foi diminuindo a velocidade até que encontrou outro carro e ela se perdeu na sua visão. O tempo se passou até que um belo dia ela o encontrou no banco do passageiro de uma amiga, que já estava perdidamente encantada pelo o roteiro dele. Ela deu de ombros e saiu em baixa velocidade pela estrada de sempre. Fazer o quê. Quando a estrada é muito longa, a gente vai aprendendo que é melhor estar acompanhado de afeto pra diminuir a distância. O orgulho só deixa essa via maior.

image

autor_jorge

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *