A gota e o tempo.

Resolvi arrumar o que fazer naquela viagem, não que eu tivesse dezenas de opções, mas a revista não parecia ser um atrativo tão bom, as músicas do iPod não me prendiam mais. Pra ser sincero o tédio daquele trânsito tinha consumido todas as minhas formas de distração daquela viagem. Deparei-me então com aquela gota de chuva, que atire a primeira pedra quem nunca se prendeu a uma. Ela estava lá, parada, por segundos é verdade, mas por tempo suficiente que eu pudesse analisá-la. Já não bastasse ela vir de uma altura absurda. Aquela distância incalculável entre a nuvem que a soltou e a janela do meu ônibus. Ela ainda se deu ao trabalho de se prender ali, não contente apenas com isso, ela começa a descer. Se eu fosse uma gota e viesse de tão longe e pudesse escolher será que eu desceria mais? Não deu tempo de pensar muito ela já havia se juntado a mais ou menos outras oito, nove gotas. Já era uma bela de uma gota que deixava seu rastro para trás e crescia rápido, em direção a borracha da janela é verdade, mas crescia. Até que então sumiu. Era estranho. Naquele curto espaço de tempo eu tinha tirado uma lição tão simples de uma gota.

É fácil e elegante estar no alto. Como a vista é linda da roda gigante, já dizia o poeta Rodox. Só que quando tudo parece perfeito e belo lá de cima, você cai. E a queda algumas vezes é longa demais, parece que não vai acabar. Você começa a procurar culpados, isenta seus erros, se livra da culpa. Fala dessa sociedade que te engole, que estamos caminhando a passos largos para substituir o “Bom Dia” por um “E ai acabou?”. Que o tempo parece não parar enquanto você foi arremessado em queda livre. É mais triste ver que nos acostumamos a viver assim, e achamos que isso é o mais correto e que isso é o que realmente vale para que possamos ser felizes. A maldita queda livre acomoda, maldito capitalismo e socialismo preguiçoso. As regras cansam, as leis enchem o nosso saco, nossos prazos são encurtados e nossos dias também.

E dai você lembra, que ontem foi acordado e tinha apenas aquele sonho bobo de ter 18 anos, poder entrar na faculdade e dirigir o carro da mamãe. Queria que o gosto da cerveja parasse de amargar a sua boca, queria também, que aquela menina morena dos olhos azuis que sentava na terceira fileira te desse uma chance de dizer o quanto ela era linda. Você começa a entender que a sua queda era parte do destino, para de isentar os outros de seus fracassos e enganos, para começar a ponderar o que conquistou com tudo isso. Tornou todos esses sonhos em realidade. E você depois de tempos em tempos caindo, para de querer achar culpados, para de querer isentar seus erros, você para de cair. E começa a conquistar. Afinal, parte de ti, quem conquista é você.

Você consegue tudo que você acredita que conseguiria, buscando as pessoas certas nas horas certas, as erradas nas horas certas, até as boas, nas horas erradas, claro, as erradas nas horas ruins. Mas conquista. Sonhando ou não. Você para de perder e começa a agregar, começa a juntar os seus parecidos, começa a se juntar com quem se identifica, como a gota que se junta com outras gotas, cresce, embala e vai. E volta a crer que só queria fazer com que as coisas dessem certo, por mais tempo. Começa a agregar cada vez mais e mais, e começa a deixar sua semente, sua marca. Você também começa a deixar seu rastro. Talvez sonhasse que as coisas tivessem mais tempo para poder dar certo.  Quer saber, vou sonhar. Quem saiba dessa vez eu sonhe com um dia de 40 horas. Já iria me ajudar em muita coisa.

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autor_jorge

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