E se…

Aqui eu sou rei. Eu dito as regras, eu faço a ordem eu sou o que eu quiser, afinal de contas o jogo é meu, e ninguém me vence se eu não quiser. Aqui se as coisas não saem como eu planejo é simples, começo de novo, reinicio. Apago o que acabou de acontecer começo literalmente do zero, como bem entender. É estranho. É fácil demais.

Talvez seja por isso que eu não tiro meus olhos do meu iPhone, meu aplicativo é legal demais, é mais legal do que o negro com jeito de jogador de basquete que acabou de entrar no vagão. Ou a menina ruiva, parece a vocalista do Paramore, e está esperando alguém ligar, não parar de girar o celular entre as mãos, e olha fixamente para ele. Mas deixa eu voltar para o meu reino, é bem mais legal. Meu mundo é fácil de acontecer o que eu quero, é fácil eu não me surpreender.  Não é que eu não queira ser surpreendido, eu só não sei lidar tão bem com surpresas.

Mas por mais que meus cavaleiros e meus soldados pareçam focados em obedecer meus comandos, os meus comandos reais, eu não consigo dar. Ela parece tão graciosa, tão simples e tão bela sentada com as pernas juntas e a bolsa apoiada no colo, escuta seu fone de ouvido e olha para o teto do vagão como se buscasse algo. Provavelmente busca a letra da música que acabará de errar. Erra e sorri. Um sorriso lindo.

Lá estou, totalmente perdido, e olha que eu sou um exímio estrategista nesse meu jogo, adoro atacar com os arqueiros primeiro, eles acertam de longe, abrem a guarda do adversário e me deixam chegar com a infantaria. Vou tentar usar isso, vou ficar de longe, mas vou atacar, então eu olho e olho fixamente. Ela vai perceber que é pra ela, não tem como as pessoas sentem que estão sendo atacadas. Pelo menos meu aplicativo emite um barulho excelente quando estou sendo atacado.

Ela olhou, e me viu “atacando”. Agora eu estava sem saber pra onde correr, e segundo minha tática eu deveria chegar com as minhas tropas de corpo a corpo. Não consigo me mexer, estou congelado e não consigo fazer nada além de tentar mudar meu foco. Na verdade, abro um leve sorriso, sem graça, fico vermelho e não sei o que fazer. Ela repara, olha nos meu olhos, aquele olhar de graça, se franzi com a sua testa, ela me fulmina e olha para baixo. Balbucia algo enquanto muda de música, tira o cabelo da cara e balança a cabeça negativamente. Acabei de perder todas as minhas tropas, ataquei, e pensei que não seria atacado.  Pois fui. Atacado e atropelado.

Me recolho acho que vai ser melhor assim, não sou fã de derrotas, mas as vezes tenho que aceitar,  quando estou me tirando para o meu reino digital, olho uma última vez, olho por baixo, como se ao invés de atacar com flechas, dessa vez atacasse com rosas ou tulipas. Vou com a guarda baixa, e reparo que ela me olha, dessa vez, o sorriso sai dela, não tímido como o meu, mas de graça. Não me controlo e sorriu também. Recebo um sorriso mais largo, mas não muito longo. Ela se levanta, e o vagão para. Ela desce. Me olha rápido e se vai.

Eu então continuo no meu vagão, volto pro meu reino. Talvez a primeira menina que me repreendeu fosse boa de riso, e a menina que me sorriu fosse boa de bronca, talvez um dia conheça alguma, talvez não. Uma coisa eu sei, o vagão segue. E quem sabe um dia entre outro sorriso, ou outra franzida, quem sabe um dia eu ganhe um tchau, ou um telefone….quem sabe um dia ela volte. É por isso que jogos são fáceis, eu voltaria na parte em que eu começo errando.

autor_jorge

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