uma outra perspectiva

Lá vem você mais uma vez com esse olhar pra baixo, esse olho inchado de quem chorou durante toda a última madrugada. O prato na mesa ainda é quase que inexistente, os e-mails no trabalho continuam se aglomerando na sua caixa, se apinhando cada vez mais até somarem um número expressivo o suficiente para que você simplesmente acorde. Você ainda não mudou a foto do fundo do celular. É aquela com o efeito mais simples, que você mostrava a língua e ele fazia careta. Que vocês estavam com as mãos entrelaçadas, cabelos desalinhados e fantasiados de “casal feliz”. Foto bonita de se ver e amarga demais ainda pra se digerir.

Fico imaginando quantas vezes você ainda vai sofrer por cair de lugares que você já tinha passado do topo faz tempo. Era tão simples de notar, todo mundo conseguia enxergar, só você que não queria. Que mesmo ele sendo maior, o olhar que vinha do alto era o teu. Que o olhar mais alto, é o que consegue olhar pra baixo e acalentar, cuidar e proteger. O olhar de baixo é o que costuma fazer cara de dó e pedir tudo. Olhar que vem da parte de baixo, para em qualquer mureta, qualquer lombada é muro. Qualquer atrito é motivo pra parar e dar meia volta. O olhar mais alto vê além do muro, vê o sol se pondo. É o olhar que avisa o coração que dá pra chegar onde quer. Que autoriza o braço a pegar pela mão e deixa boca abrir e dizer baixinho no pé do ouvido: “Vamo junto, confia em mim.”

Já reli esse manual de uma mulher que sofre sozinha algumas dezenas de vezes. Vou te adiantar que ela emagrece loucamente, os olhos ficam fundos como se todo o peso da saudade dela repousasse ali.  Ela adoece. Sofre alguns efeitos colaterais. Começa a querer procurar o problema que não é dela e dar a razão pra ele. Orgulho e amor próprio simplesmente desaparecem do vocabulário diário. E então ele pode ter mudado. Que a conversa dele, agora faz sentido. Ou que ainda não tinha sido visto dessa forma. Tudo era uma questão de ponto de vista. Mas meu bem, nesse papo de perspectiva já vi meio mundo colocando a Torre Eiffel na palma da mão. Colocar alguém no bolso com meia dúzia de palavras não parece ser tão complicado.

O mundo é muito pequeno pra que a gente passe mais tempo amargando lembranças do que escrevendo novas histórias. Com essa covinha que você apresenta na carona do teu sorriso, eu já estaria rabiscando outros capítulos para o meu livro. Ao invés de ficar recitando os mesmos versos. Preenche teus próprios vazios, enche teus contos com as tuas conquistas. Conta às histórias das tuas cicatrizes com deboche. Faz piada da tua desgraça e se alegra com o que você viveu. Se nem a Bahia, que é de todos os santos tem um santo só. Por que diabos você quer depositar tuas preces em alguém que nem santo é? Respeita pelo menos o resto da tua fé.

Tô aqui pra te tirar dessa confusão que você tem um tesão enorme em sempre voltar. Tô contigo pra te fazer enxergar o mundo com outros olhos além do dele. Que os olhos verdes do teu vizinho ou os óculos da tua amiga da faculdade podem limpar essa visão embaçada que você tem do mundo. Que a gente pode enxergar muita coisa junto, e se for pra acontecer, a gente pode até cruzar uns olhares uma vez ou outra por aí. Só para com essa bobagem de ficar olhando pro chão. Se você pudesse se olhar e entendesse como você fica linda olhando todo mundo lá do alto, talvez você ficasse apaixonada pelo teu próprio ponto de vista.

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autor_jorge

eu e você. já pensou?

Já pensou que louco seria eu e você? Quando eu te disse isso há 10 anos atrás em pensamento você não escutou. Minha timidez nunca me deixou te mostrar o quanto você é essencial para mim e por isso o meu verdadeiro eu foi mais fraco do que aquela vontade de te ter.

Não sei definir bem timidez, mas a timidez me definiu durante todo esse tempo. Só que hoje quando te vi do outro lado da rua segurando a mão que não era a minha cai na real dessa perda de anos e momentos que eu, apenas eu deixei nos manter separados, em sigilo.

Tudo o que eu queria é me aconchegar no teu corpo num domingo a tarde vendo filme. Eu contaria todas as suas respirações só para não perder o que te dá vida e o que me da sorrisos. Pensar em você, mesmo sem que saiba disso, me traz sossego. Sossego esse que fortalece os meus sentidos.

A imagem de outro dia na rua continuou na minha cabeça por muito tempo. Eu não queria sentir isso, mas o meu medo me venceu mais uma vez quando uma gota escorreu dos meus olhos pelos contornos do meu rosto.

Meus lábios que deviam beijar a sua boca tremeram e não conseguiram gritar para todos naquele momento o quanto eu te quero. O quanto eu sempre te quis. Se você soubesse eu te faria acreditar que a felicidade é o que nos definiria.

E que aquela mão entrelaçada na sua seria a minha. Um dia quem sabe…

autor_helena

sem tarô, sem dor, só amor, por favor.

Tô aqui parado na frente do espelho do banheiro. Por toda a minha volta já tem arruda, pé de coelho, gato de tudo que é cor, vela de cheiro ou de quinze dias, terço, Buda e todos os outros santos que a sociedade moderna resolveu adotar para poder admirar. Já tentei rezar em todos os idiomas, talvez, tenha pedido ajuda até pra quem não tem poder. Tô apelando pra fé, se ela de alguma forma explicar como coisas que pareciam tão boas desaparecem do dia pra noite, já estará sendo bem válido. E vou esperar isso de alguma forma que não seja em palavras ou sermões, eu acreditei em absolutamente todas as coisas que eu ouvi nos últimos dias. E posso jurar que não era assim que eu me encontrava no final delas se eu as seguisse tão ao pé da letra. Por isso tá faltando um reflexo ao meu lado nesse espelho.

Descartei esperança. Agarrei firme na fé. A esperança aceita conviver com a existência da dúvida. A fé não. Apelei para os tarôs, joguei tudo que precisava e tentei ler tudo. A borra de café só me dizia que não se fazem mais safras como as de antigamente. Só não sei responder se não se fazem mais safras de cafezais ou de quem cuida dessas safras. Aliás, parece que ninguém mais cuida de nada.  Agora não sei se quem me disse isso foi o baralho exotérico ou os feijões que arremessei pela casa. Gosto do baralho pelo fato de se poder jogar com ele se nada der certo. Oras, todo mundo gosta de um bom jogo. Principalmente quando ele sai exatamente como queremos, sem sustos, sem surpresas e com o outro de cabeça baixa do outro lado da mesa. Só que não tá faltando alguém assim do outro lado da mesa assim, é porque o alguém sou eu, né?

A gente passa a vida toda esperando pra sentir uma coisa que cada um fala de um jeito. Que cada um reage de uma forma. Que uns dizem que é pra sempre, outros que duram poucos dias. Que faz a gente chorar de alegria e de dor. Que faz a gente gaguejar de felicidade e tristeza. A gente cresce sonhando em um dia amar que nem os nossos país ou avós. Que mesmo que não seja de uma forma arranjada, ele vai acontecer de alguma forma. Quando acontece a gente começa a fazer um bando de perguntas, que não tem resposta. Ou muitas vezes não queremos  que ninguém responda. Talvez pelo fato de que quando as coisas fiquem muito explicadinhas elas possam perder esse tal encanto. Pedem pra gente crer que o amor existe, mesmo que a gente não possa tocá-lo. Quando ele some, querem que a gente supere de forma natural. Vocês não entendem o que é, não conseguem explicar, mas todo mundo é pró na arte de explicar como se cura? Por favor, me poupem.

Acontece que eu cresci fazendo as coisas como mandam as pessoas. Orientei-me pelas reações que vinham nas bulas dos remédios. Chamava os mais velhos que sempre me explicavam quando eu não entendia. Quando eu era pequeno e me machucava, apontava com o indicador aonde doía pra minha mãe poder cuidar de mim. Agora eu to com o dedo apontado em riste, bem no meio do meu peito, sem remédio, sem reza e sem nada nesse mundo que o faça parar de doer. Mas quando você passa tudo fica mais leve, ou pelo menos por um tempo curto que seja eu esqueço essa dor e consigo até respirar melhor.

Eu não acho que você seja o remédio, mas acho que você sabe exatamente as doses certas dele. Sabe a intensidade necessária. Então por favor, espere eu me acostumar com cada efeito colateral. Diminua as suas doses devagar até o momento onde eu não precise mais delas para respirar. Não quero substituir amores, não quero apagar aprendizados, nem substituir lembranças. Só quero desacostumar. Pra deixar meu corpo reagir sozinho. Se ele cria anticorpos pra tanta coisa que já me fez mal, uma hora ele também vai criar alguma coisa que proteja desses amores tolos que passaram por aqui.

Não é um amor que cura outro. Não é um remédio que substitui o outro. Não se troca de santo pra trocar de causa. O amor maior tem que ser o próprio, remédio bom é aquele que faz a gente viver sem ele depois do tratamento. E ao invés de trocar de santo pra pedir, agradecer por tudo que eles já fizeram ajuda bastante.

Sem tarô, sem dor, só amor, por favor.

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é clichê, mas estava escrito.

Já parou para pensar que um dia tudo isso que tivemos até aqui seja o nosso destino? Você luta em dizer ao contrário que não acredita nessas coisas, mas sempre acho que você para e pensa no que eu te digo que a nossa história está escrita da forma mais marcante que pode acontecer entre duas pessoas.

Você com esse seu jeito turrão e protetor se esconde debaixo dessa roupa social e me encanta! Claro que me faz rir porque nessa elegância como pode alguém conseguir ficar tão sério quando eu conto a piada mais ridícula da face da terra?

Só o fato da gente ter nascido no mesmo dia e no mesmo hospital só que com um ano de diferença já me tira o fôlego! Na nossa primeira troca de olhares já fui cativada por você sem nem saber nada dos seus gostos, lembranças, cheiros preferidos, medos…

Na rotina que muitas vezes nos cega para momentos tão importantes e que podem mudar as nossas vidas você apareceu e mudou a minha! Eu que sempre leio um livro no ônibus naquela sexta-feira por um acaso do destino esqueci em casa. Deixei meus contos sobre a Grécia antiga em casa e eis que como de dentro do meu livro você apareceu!

Todo atrapalhado mas com uma elegância sem tamanho você passou pela roleta e eu no ultimo banco do ônibus cravei meu olhar em você! Acho que até te assustei mas senti um negócio que nem consegui disfarçar! Todo acanhado você até fugiu de mim e sentou bem longe.

Desço do ônibus naquele dia com uma sensação estranha! Eu sabia que você tinha alguma coisa de tão especial e tive certeza que nossos caminhos iriam se cruzar novamente, mas fiquei brava comigo por ter te assustado.

Uma semana se passou e eu não te vi mais! Até deixei o livro em casa para ver se dava sorte só que nada de você aparecer! Em uma sexta-feira novamente eis que meu coração pulou no peito. Dessa vez eu é que estava distraída quando você sentou ao meu lado. Lendo a história de Afrodite senti sua presença tão forte do meu lado que quando levantei a cabeça você é que estava me olhando. Vai dizer que não era o destino?!

Só sei que cinco anos se passaram e você passou a ser a minha rotina e o desenho da minha vida, do meu destino que tanto me encanta com sua surpresas. E que os deuses continuem nos abençoando com seus mistérios e sabedoria, porque tudo aconteceu da forma como eles queriam e eu acredito nisso.

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tudo arrumadinho pra você voltar

Só queria dizer que acordei com vontade de te ligar, uma vontade enorme mesmo. Daquelas que me fazem desviar todos os meus assuntos pra você. Essas coisas bobas que só a gente entende. Deu saudade da sua risada, meio descompensada, mas aquela que me faz ter vontade rir mesmo que a piada seja péssima. Eu consegui terminar aquele projeto que tanto atrapalhava os nossos horários, aquele que me fazia perder o humor do meu dia e descontar tudo em você. Eu queria te ligar pra dizer que você pode dar uma passada aqui se quiser, almoçar comigo, juro que aprendi dessa vez a não deixar mais o arroz queimar e tem um chinelo bem do lado do sofá pra você poder tirar o salto e descansar o pé assim que você chegar.

Já joguei fora aquele tênis eu você odiava, prometo também não usar mais aquele agasalho velho que você queria atear fogo. Mas esse eu não vou jogar fora por ser o meu favorito. Mas vou respeitar a sua opinião enquanto você estiver aqui. Eu fui dormir na noite passada sozinho. Sentado na sala, com a televisão ligada naquele filme que a gente não se cansava de assistir. Só que o cobertor só cobria o meu corpo, tinha espaço suficiente pra você. Tinha espaço dentro do meu abraço e minha perna ficou ali sentido falta de como você repousava a sua por tanto tempo que chegava até formigar. Só que quando o filme é visto sem os teus olhos ao lado dos meus ele perde a graça. Parece que as cores já nem estão tão vibrantes e a trilha toca tão baixinha que eu quase não consigo ouvir.

Queria pedir desculpas, mas você sabe que eu não sei fazer essas coisas. Você me conhece e sabe que eu coloco orgulho dentro do meu prato, jogo duas colheres de farinha e almoço ele todo santo dia. O gosto é péssimo. Posso beber o que for com essa mistura que eu ainda sinto o amargor. E só você sabia como tirar esse sabor da minha língua. Aliás, você fazia isso de uma forma tão natural que eu ainda custo a acreditar que você se foi. Eu podia me deitar em qualquer posição, com a cabeça no seu colo que eu me encaixaria perfeitamente. Se você soubesse o desespero que eu sinto, toda vez que eu penso que nunca mais vou conseguir te dizer o quanto eu te quero bem, você vinha correndo e desamarrava todo esse nó que a sua falta faz no meu coração.

Lembro muito bem, como você dizia dos problemas das suas amigas, eu ouvia calado. Quase nunca te respondia, interrompia a maioria dos seus desabafos te agarrando forte pela cintura e tirando seus pés do chão. Você me abraçava e encostava sua testa na minha. A gente sorria. O sorriso mais gostoso do mundo. Das vozes que eu ouvia todos os dias, a sua era sempre a que me trazia paz. Seu sotaque reprimido, da menina que chegou à cidade e já se adaptou com a forma irritante e coloquial daqui. E você dizia que só queria viajar sem rumo pelo litoral, que ainda compraria as passagens das suas viagens só como ida. Seu olho brilhava a cada palavra que você falava da gente. Vejo todo mundo implorando pra ter uma felicidade igual a nossa, que me dói acreditar que você realmente desistiu de tudo tão fácil.

Eu sei de muita gente diferente que fez esse mundo melhor junto, gente assim, igualzinha à gente. Cheia de vontade de conhecer o mundo, que gosta de deitar a cabeça na grama pra apontar pras estrelas. Que bebe do mesmo copo e que gosta de desligar o telefone por já estar com a única pessoa que queria ouvir. Gente que diz ser feliz só que nunca sentiu aroma do seu perfume. Gente de bons ouvidos que nunca ouviram o seu sotaque. Gente que se diverte com o que tem. E eu tenho uma porrada de defeitos, mas que quando juntam com os seus, que nem são tantos assim, eles somem. Talvez isso seja sorte, é verdade. Ou talvez seja a gente se completando.

Então se por um minuto, você se olhar com os meus olhos e souber como é bom amar você. Bate aqui na minha porta?

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só pode ser com você

Hoje me peguei lembrando daquela noite inesquecível que você preparou para mim. Acho que foi um dos momentos mais marcantes na minha vida e que guardarei para sempre em meu coração e levarei comigo pelas minhas próximas vidas. Parado em frente a minha casa você estava com um enorme sorriso no rosto com cara de quem tinha aprontado só me esperando chegar do trabalho. O seu cheiro já foi me alcançando conforme eu ia me aproximando de você e nesse momento minhas pernas bambearam.

Era uma quarta-feira, noite de verão e a lua brilhava lá no céu. Estranhei por ver você tão cedo parado ali, sendo que sua rotina anda tão maluca que muitas vezes só escuto a sua voz pelo telefone ou te encontro nos meus sonhos quando durmo. Mas pelo sorriso já fiquei aliviada, porque você me passou aquela segurança e felicidade de sempre quando estamos juntos.

Cheguei perto de você e nem oi pude dar. Me interrompeu ao cortar minha fala e já fez sinal de silêncio. Vinha surpresa por aí! Fechou meus olhos e não falou nada. Nem precisava porque a gente se entende muito bem em todos os sinais do corpo. Entrei nas suas pistas e me deixei envolver. Com suas mãos na minha cintura me conduziu pelo portão até passar pelas escadas. Eu me concentrei em cada detalhe e movimento nosso que eu identificava. Sabia que esta noite me traria algo inesquecível!

Passou por mim e abriu a porta. Não conseguiu segurar aquela sua risada estranha que me fez rir no nosso primeiro encontro. Eu sabia que você estava aprontando e isso fez meu coração acelerar. O lenço que você tampou meus olhos era de um branco que nem algodão, mas a transparência dele me fez roubar um pouquinho pra espiar o que você andou tramando. A luz estava ambiente para não me fazer perceber o que estava ao redor, mas mesmo assim não consegui ver o que me esperava porque algo maior estava por vir.

Notei que algo estava diferente. Me desfiz dos meus sapatos e descalço andei mais alguns passos até você se libertar de minhas mãos e me deixar sozinha testando os meus outros sentidos que não fossem a visão. Ligou o som e a nossa música começou a tocar. Um sentimento bom tomou conta de mim e ao chegar perto falou em meu ouvido a frase que disse antes do nosso primeiro beijo: eu te quero por inteira pelo resto de nossas vidas. Se não for para ser desse jeito eu não terei mais sanidade para seguir minha vida.

Minhas pernas amoleceram nesse momento, porque sua voz me trouxe lembranças sobre nós que eu tinha guardado tão bem escondido em meu coração para nunca perder um pedaço que fosse do nosso amor. Acho que deu certo, porque nesse momento você me beijou e eu sabia que a nossa sanidade ia caminhar lado a lado para sempre. Foi então que você tirou o lenço dos meus olhos e eu nem me dei conta que mesmo as velas que você acendeu pela casa inteira, o cheiro da comida fresquinha na mesa da sala e as pétalas de rosa enfeitando o chão não foram nem a metade da surpresa que eu vejo todos os dias no brilho dos seus olhos.

Foi então que eu conclui que a minha grande surpresa sempre foi você!

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autor_helena

tem tempo pra tudo lôra

Você vai falar que eu preciso parar de beber, meu caro, eu até concordo com você. Mas foi bebendo que eu a encontrei pela primeira vez. Sabe aquelas coisas de tarô? Mandinga? Superstição? Sou desses que acreditam que se eu tirar a toalha vermelha da janela ela não vai saber qual é o meu andar sabe? Lembro exatamente de cada detalhe dela saindo do mar. Eu ali parado, sentado na areia, pernas esticadas, fones nos ouvidos que declamavam John Mayer e acompanhado apenas daquele livro massante. Minha única alegria era uma saudade que a música me dava que eu embebedava com meu copo de caipirinha. Foi então que você saiu devagar do mar, lentamente, para que eu realmente desistisse de tentar ler aquele livro e vidrasse meus olhos em ti.

Sem nenhuma pressa você caminhou do mar até a sua canga estendida ao lado de uma amiga. Deitou-se devagar, com a barriga pra baixo. Os cabelos ainda molhados pelo mar, não conseguiam esconder o dourado de cada fio. Você falava e gesticulava até mais rápido do que eu conseguia acompanhar. Pegou a sua amiga pela mão e a puxou pra perto. Falou algo em segredo, quase no pé do ouvido. Ela sorriu e você também. Vestiu um chapéu pequeno e bem detalhado. O seu óculos parecia ter sido desenhado exatamente para o seu rosto. Você tinha prendido a minha atenção sem nem ao menos olhar pra mim. Se isso não era o destino querendo nos juntar de alguma forma eu gostaria que você me explicasse o que é.

Ficamos lá até o sol começar o seu espetáculo particular de se pôr. Eu rodeado dos meus amigos, você com a sua amiga pra conversar e todos os olhares da praia pra iluminar. Eu ainda confabulava alguma forma tola de chamar a sua atenção. Refleti o suficiente para decidir ir embora.  Sem lhe dizer uma única palavra ou ao menos tentar descobrir algo seu. Acreditei na força do meu santo e nos clichês da vida que dizem que o universo conspira a favor de quem só quer o bem. Eu só queria você. Acredito ainda que esse seja o maior bem que eu possa querer. Levantei e pela primeira vez fiz questão de que você me visse te olhando. Você prontamente retribuiu. Fazendo toda a brisa da minha última ponta simplesmente desaparecer. Gaguejei em silêncio. Acenei e você prontamente retribuiu.

Juntei minhas coisas e fui embora junto com o sol. Do caminho da praia até a casa, parei de pensar naquele rosto que podia ser de tão longe mais que tinha me encantado de uma maneira diferente. Quando a gente tá acostumado com grosserias aleatórias, o primeiro sinal de afeto retribuído faz a gente pensar que a pessoa não é do mesmo lugar que nós. Ei Lôra, se possível, me leva pra esse lugar onde todo mundo tem esse sorriso que não acaba nunca? Saí daquelas areias com um sorriso dela. Parecia mais um daqueles amores de metrô. Que quando o flerte já está no platô, alguém desce na próxima estação. Tive o tempo todo do lado dela e não aproveitei. Talvez esse seja o principal problema da gente. Esse tal de tempo. A gente deixa de buscar nossas vontades pelo tempo que podemos demorar pra conquistá-las. Nessas horas a gente esquece que o tempo passa com a gente correndo atrás ou não.

A festa daquela noite eu passei o tempo todo te procurando, encontrei olhos que hipnotizam, batons borrados, copos quebrados, corpos colados e tudo isso, procurando os teus fios de cabelo dourados. Quando o tempo da festa acabou, o sol, que tinha se despedido da gente, resolveu aparecer. Veio colorindo todo o céu, avermelhando pouco a pouco. E quando eu já sentava na pedra esperando as nuvens cobrirem aquele céu cor de vinho, você se sentou ao meu lado. Sem amigas, sem distância, sem cadeados nos portões ou sem nada que nos separasse. Pés descalços, chinelo na mão, cabelo preso com uma flor. Realmente acreditei que você tivesse caído do céu. Mas éramos apenas eu, você e o barulho das ondas. E Lôra, na batida desse som, eu passo o todo o tempo que me restar nessa vida com esse céu cor de vinho amanhecendo sobre nós.

Sem pressa Lôra, temos todo o tempo do mundo, já dizia Renato Russo.

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nunca quis tanta saudade

Quando chega o horário de verão eu sei que meu coração vai se sentir mais importante entre todos os sentidos que me fazem viver. Talvez você nem saiba da minha existência ou talvez eu tenha certeza disso, mas meu riso fica tão bobo quando te vejo no calçadão da praia que nem ligo pra esse amor platônico de verão. Mas sei que tudo pode mudar num piscar de olhos.

Já te vejo faz tempo viu! Sei cada detalhe do teu corpo, mesmo que por debaixo da roupa, e hoje posso dizer que reconheço os seus passos de longe. Louco né esse negócio de sexto sentido de olhar adiante e reconhecer alguém de longe?! Vai ver a gente viveu alguma coisa em outra vida e hoje tenho esse dom de te sentir chegando! Sentada em um dos sete canais que cortam a nossa cidade eu viajo no tempo e na vida! Olho para o sol e ele me olha. Me questiono se você um dia reparou em mim e isso me causa uma sensação boa. Entre uma música e outra que toca no meu fone de ouvido deito para o sol fazer o seu trabalho e revigorar o meu corpo! Marisa Monte abrilhanta minha playlist e entra na minha mente de um jeito que me faz cantar em voz alta sem perceber. “Eu só quero que você saiba que eu estou pensando em você…”.

Não sei se depois disso eu fiquei roxa de vergonha ou do sol que me iluminava, mas você simplesmente surgiu não sei da onde bem do meu lado fazendo sombra no meu rosto! Rezei e não ao mesmo tempo pra você não ter me escutado e acho que deu certo de uma forma ou de outra. Você tava lindo sem camisa e de bermuda com tênis de corrida. O boné nem comento porque é o teu charme. Você tocou levemente no meu ombro pra me chamar e eu quase cai dentro do canal e isso fez você abrir o maior sorriso que eu já vi na vida!

Foram poucas palavras que trocamos, até porque você me chamou pra pedir protetor solar emprestado pra passar na tatuagem. Eu emprestei e a única palavra que consegui dizer foi – É claro. Pode usar! Fiquei olhando pelo canto do óculos escuro você de perto desde que te vi pela primeira vez lá no final da areia se alongando. Mas tudo passou tão rápido dentro da minha cabeça que quase não percebi o que você me disse.

– Marisa Monte né?! Tá com sintoma de saudade por alguém?
– Como a gente pode ter saudades de alguém que nunca tivemos?
– Boa pergunta, mas eu acho que nessa vida vale ter saudades até do que a gente nunca teve.

E foi assim que comecei a ter saudades do que eu passei a ter. Depois disso nos encontramos mais vezes e o sentimento que nos aperta o coração passou a nos unir ainda mais numa linda história de amor.

 

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carta pra você que ainda não veio

Senhor, hoje gostaria de aproveitar que você ainda não chegou até ela pra lhe dizer algumas coisas importantes, das quais você nunca vai saber exatamente como aconteceram, mas vai entender que tudo estava muito claro desde o início. Para não se assustar depois, gostaria que soubesse que essa rodovia vai acabar naquele café péssimo daquele empório caríssimo. Lá você esbarrar com ela. Ombro com ombro. Exatamente como nos filmes. Ela vai te sujar. Você vai se irritar bastante. Até que ela vai te pedir desculpas loucamente. Quase criando uma palavra só com uma sequência infinita de desculpas. Vai te olhar de baixo pra cima por você ser maior que ela. Você vai tentar responder grosseiramente. Mas seus olhos vão se encontrar nesse momento. É nessa parte que a única resposta que você vai conseguir soltar é um breve suspiro.

Aqueles minutos sequentes desse pequeno acidente, você vai conhecer uma mulher fantástica. Praticamente impossível de se acompanhar e qualquer situação que seja. Repara bem nos olhos dela, em como eles correm por todo o seu rosto enquanto você mal consegue se concentrar no sorriso dela. Você ainda está tentando lembrar o nome dela e nesse pouco tempo ela já sabe cada traço teu. Quando a gente conhece alguém a gente começa a acreditar que o destino é um negócio engraçado. Se colocassem alguém antes na nossa vida a gente tem a sensação de que não aproveitaríamos tanto. Ela entra exatamente no momento certo, pra apagar todas as mágoas que alguém deixou pra gente.

Rolam boatos de que ela é complicada de se lidar. Daquelas que a gente fica tentando decifrar sem que ela perceba. Essas mulheres que parecem que viveram mais do que a idade realmente representa, que passeiam pelo mundo como se já conhecessem cada pedaço desse chão e como quase nada nesse lugar parecesse novo aos olhos dela. E ai meu amigo, você se agarra naquela dúvida desgraçada de: “Como eu vou surpreender alguém que já viu de tudo?”. Daquelas que quase não abraça ninguém pra não dar liberdade, que tem o traço forte e a sobrancelha arqueada quando escuta alguma coisa fútil que não acrescenta em nada na sua vida. Dessas que não choram na sua frente. Que parece ter resposta pra todas as tuas perguntas e que consegue te dar uma bronca sorrindo. Que arranca o seu suspiro apenas te olhando, como fez lá naquele café.

Ainda ouvi algumas conversas, que ela coloca a culpa de tudo no amor. Aquelas mulheres que preferem amar só da porta de casa pra dentro. Essas que no trabalho, pode escolher qualquer um dos homens que trocariam suas horas de almoço por minutos de café ao seu lado. Mas prefere almoçar sozinha e deixa pra eles apenas o perfume doce que faz a engrenagem maliciosa da nossa mente masculina girar. De tantas pessoas que não souberam amar, hoje ela se blindou do amor. Só que tem algumas coisas na vida que ou a gente perde o medo, ou o medo vai fazendo a gente pouco a pouco perder a vida. E o amor é uma delas.

Hoje em dia, atrás de todo esse escudo, ela passa a maquiagem mais leve pra te receber. Mesmo sabendo que você só vai lá pra jantar uma pizza e assistir TV. Que ela corre pelos cantos da casa, com a toalha enrolada e falando com a melhor amiga de como deve se portar quando você chegar. Pergunta pra agir exatamente ao contrário. Por birra mesmo. Ela gosta de contrariar. Também gosta de você. Toda essa frieza foi de amores não cicatrizados. Acontece que a vida é assim. Vem um amor logo depois de outro, pra poder cicatrizar. Até que chega um que não fere. Não machuca. Nem deixa outro existir.

E ainda mancha a nossa roupa de café, querido.

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motivo do meu sorriso

Nós somos o fruto daquilo que vivemos. Talvez em um passado não tão distante ou em vidas passadas. Eu acredito que nós temos o dom de transformar qualquer sonho em realidade e se isso não for possível o nosso coração nos mostrará novos motivos para seguir. Seja no amor, nas amizades, no trabalho ou em qualquer palavra que eu não consegui pensar antes de terminar esta frase. Só que se hoje te dissessem pra sonhar, com o que você se atreveria a imaginar? Eu tenho dúvidas e você vai saber o motivo.

Se desamarre de qualquer conotação ou paradigmas que alguém já enfiou na sua cabeça ou que a própria sociedade fez você ser refém. Eu acho que o amor cura tudo isso, porque se um sentimento tão puro e verdadeiro não vencer, eu não sei para onde estamos indo. E com você do meu lado eu posso ter tudo. E foi nessas ideias de “sonhar e viajar”, ou então nas de “para onde vamos e o que sentimos”, que eu achei um velho retrato nosso. Era em P&B e eu quase chorei ao ver a gente ali só por estar nessas cores que mostram a verdade, mostram sentimento e sim dão cores a nossa imaginação. Somos tão felizes e ter você subindo o zíper do meu vestido, quando meus braços não alcançam, é um dos momentos mais felizes que eu sinto no dia a dia. É porque te tenho por perto. Se isso não for realidade eu não sei mais o que significa.

Ter a sua companhia nos pequenos detalhes e momentos do dia, da semana, do mês, e ufa, do ano é o que me faz seguir. Gosto de quando dançamos na sala, de quando você me cobre enquanto eu finjo dormir, de quando você lava a louça (disso então eu gosto muito hahah), de quando cantamos que nem loucos no carro e gosto mais ainda de você. E vendo outro dia um desses dizeres populares atrás da porta do banheiro do cinema, enquanto você me esperava do lado de fora todo impaciente, que eu me dei conta que o riso anda sempre comigo, principalmente nos pequenos detalhes. Era uma das frases mais simples e pequenas da porta, mas me chamou a atenção e dizia assim: “rir dá rugas, então ria, porque assim se vive”. Que cabeça genial escreveu essa frase? Quero conhecê-la.

Foi aí que refleti me olhando no espelho e vi que algumas rugas já ameaçavam embelezar o meu rosto. Quando cruzei a multidão que entrava em uma nova sessão do filme te vi com as mãos no bolso olhando distraído e congelei aquela imagem pra mim. Seus olhos me encontraram e eu lembrei que se sorrir dá rugas é sinal de que meu riso vai ser eterno com você. Isso porque quero passar o resto da minha vida tendo você morando na minha boca. E se me perguntarem se ainda tenho sonhos vou dizer que são muitos. Mas hoje eu ainda vivo o meu maior então vou ousar imaginar em outro segmento, porque no amor as minhas realizações já são constantes. E você sabe muito bem do que estou falando!

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autor_helena