o mundo de uma maravilha só

Eu nunca fui dono de muitas coisas nessa vida. Em raros momentos tive alguém pra poder chamar de “meu”. Cresci lidando com o frio sozinho. Nunca morri por isso. Enquanto eu colecionava decepções, você colecionava carimbos no seu passaporte. Você livre. Eu comum. Você com saudade do mar. Eu tentando amar. Foi te admirando de longe, que eu fui aprendendo a gostar de alguém.

Se a gente desenhasse uma zona de conforto, numa folha de papel, você seria um pontinho completamente fora do circulo central. Quase saindo da folha. É o que me faz querer sair daqui também. Dessa estufa de mesmice. Numa mescla de agonia pra conhecer o mundo com a sua voz dublando todas as línguas que eu nunca sonhei em pronunciar. Você foi embora e me faz querer ir junto. É tudo muito claro. Eu não quero você no meu mundo, meu amor. Eu quero fazer de você o meu mundo. Me busca?

Me busca pra que eu possa ligar pra minha mãe com alguma história inédita e só nossa. Pra sempre que ela me perguntar se eu estou bem, uma alegria desenfreada cuspir toda a minha felicidade de estar com você. Visitar os templos mais antigos, as maravilhas do mundo, só com você do meu lado.

Mas no fim, você foi embora. Aliás como quase tudo que aconteceu na minha vida. Dar certo, pra mim, sempre teve muito com o quanto a gente é capaz de suportar perdas nessa vida. Você é um pedaço do mundo que nunca foi exatamente “meu” pra contar história. O que me confunde de verdade é se nunca será ou se ainda ta estudando um pouco sobre o mundo pra um dia poder me contar tudo. Talvez, numa quarta meio nublada, você apareça aqui na porta da minha casa. Me pegando pela mão e dizendo que precisa me mostrar o mundo todo. Eu juro que quando isso acontecer eu desejo acordar só em outro continente. Viajar por todas as maravilhas que dizem existir por esse mundo. Só pra confundir a humanidade. Afinal, a única maravilha desse mundo que sorri e pode visitar todas as outras é você.

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autor_jorge

os dois lados

Ócio de uma quinta feira nublada me pego pensando que é foda! Tudo, desde a probabilidade absurda de chutar quinas de móveis com o dedinho do pé, até encontrar o ex com a atual no deserto do Atacama. Puta que o pariu. A vida é foda! Mas nem tudo é foda de forma negativa, também é foda como a vida nos brinda, a cada amanhecer, com uma nova chance de viver.

Com uma nova oportunidade de sermos quem queremos ser. Não é foda? Agora pensa comigo: Você conhece uma mulher na balada, linda, daquelas não exatas, risada que ilumina, postura que instiga. Conversam. Ela te dá o número do celular anotado num guardanapo, no meio um tanto de batom vermelho, e vai embora. Nem um beijo, nem um contato além do visual. Você vai pra casa pensando “Uau!” e no dia seguinte liga.

– Alô? – ela diz.

E você pensa:

– Que foda, ela me deu o número certo!

Um dia você está andando pela rua e esbarra num cara. Aquela barba, saca? Ele sorri e se desculpa. Você ri e diz que não foi nada. Numa noite, dois dias depois, encontra ele no japa. Sozinho. E pensa:

– Deus tá brincando comigo!

Ah, ele te reconhece! Às vezes é assim que o amor acontece. Foda, né? Do mesmo jeito que tudo parece certo e, de repente, desmorona sobre nossas cabeças ingênuas. Como, vez ou outra, chegamos bem perto de acreditar nos contos de fadas. É foda como as pessoas agem independente de nossas vontades. É foda entender que cada um é um ser independente de nós.

Eu queria que fosse sempre do jeito bonito, mas se não fosse foda tropeçar e cair, como poderíamos reconhecer o foda que faz sorrir? Se não fosse tão foda partir, como saberíamos a sorte de ver alguém chegar? Se fosse fácil esquecer, como poderia ser tão foda amar? Quando alguém diz que é foda, entre lágrimas, como entenderíamos se nunca passamos por lá? É preciso provar o amargor do amor e da dor.

O bom é quando a gente aprende que não precisa carregar o peso de impor nossos desejos. Que podemos ser, verdadeiramente, inteiros. Rever alguns conceitos, reavaliar nossas razões. Afinal, na lei da vida, até um relógio sem bateria está certo duas vezes ao dia. Quais são as tuas verdades? Quais coisas você valoriza? É foda, né?

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autor_kamila

vamos tentar?

São apenas desejos sinceros, rabiscados num papel amassado pela oitava vez. Sentimentos que devem parte de sua coragem aos copos de vodka que estão espalhados pela casa. São sentimentos e agonias reprimidas por um corpo que insiste em vender uma armadura que talvez eu nunca tenha vestido. Mas um corpo respeitado. Que não se curva diante de qualquer situação e que ainda tem como a capa preferida do seu uniforme o orgulho. Te escrevo sozinho. Lhe desejo uma companhia. A minha.

Palavras de alguém que rolou na cama durante toda a madrugada, procurando alguma forma de trazer pro espaço vazio dela. Pra colocar você na minha rotina matinal. Você com teus pés descalços caminhando pela casa. Esperar o ranger do piso de taco ir aumentando o barulho, até que você chegue na porta do meu quarto. Vestindo a minha camisa jeans que na noite passada eu carregava na cintura. O cabelo preso numa desordem e óculos escorrendo pela ponta do teu nariz. Nem precisa falar nada. Já sei que o dia vai ser bom começando assim.

Levantar numa manhã de quarta, atrasado pro trabalho. Mirabolar alguma desculpa fútil e poder perder mais alguns minutos te amassando dentro de um abraço. Ouvir você me chamar de louco por querer mais dez minutos bagunçando meu lençol. Por  querer te encontrar sentada no meu sofá, com tuas pernas cruzadas e aquela xícara amarela quando eu voltar hoje. Amanhã. Sempre.

Comprei aquele chinelo que você achou fofo, naquela tarde que antecedeu uma noite em que você reclamou das dores que teu salto lhe causava. Deixei um do lado do outro. Por irônia. Por destino. Por irônia do destino. Que me faz decorar cada detalhe do teu rosto e mesmo assim não te ter aqui do meu lado. Esse destino brincalhão, que me fez crescer adorando as mesmas coisas que você. Só pra quando a gente se esbarrasse na vida eu quisesse segurar tua mão pra sempre. E é exatamente assim que eu estou.

Errando o nó da gravata por me desconcentrar numa saudade sua. Que eu rezo pra poder bater nesse teu peito também. Uma saudade diferente. Uma que arde, queimando o resto de razão que me falta. Torcendo pra te encontrar descendo na hora do almoço. Pra gente falar duas graças um pro outro e sorrir. Só pra que eu possa te colocar dentro do meu abraço uma última vez. Pra jurar que eu vou te fazer sorrir todos dias, enquanto eu tiver forças.Te fazer feliz até você cansar.

É que parece loucura, mas menina, absolutamente tudo que me faz bem eu quero batizar com o teu nome. Eu te quero em todo lugar, óbvio que eu te quero pra sempre. Vamos tentar?

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autor_jorge

você tem uma nova mensagem

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…Oi.

Tudo bem?

To ligando nessa madrugada, pois ninguém costuma fazer nada que se alongue muito no começo da semana. Então resolvi contar com a sorte e torcer pra você estar dormindo e não acordar com a minha ligação. Agora chegou na caixa de mensagem, mas sabe como funciona na nossa geração né? Intensa e momentânea. Que deixa de prestar atenção no que já passou. A gente não olha caixa de mensagem. A gente não olha muito pra gente. A gente parou de se olhar do nada, né?

Eu to com saudade de te admirar, sabe? Daquele meu jeito bobo, que fica sorrindo de olhar o quão bonita você é. Essa sua covinha escapando da sua risada. Que você tinha um  jeito só seu também. De ficar me analisando e sempre que podia tirava uma foto só pra me sacanear. Me tirava a concentração só pra eu poder ficar me perdendo em você. Fica tranquila, só falei por aqui, pra poder expulsar de mim essa vontade de te abraçar. Esse caminhão de palavras já ta pesando bastante aqui dentro.

Pode ser meio bobo, mas andei procurando a respostas pra algumas perguntas que eu me lembro que você fazia. Só pra caso um dia, o acaso me pegue numa mesma roda que você. Talvez o destino seja um pouco mais legal comigo e eu não me engasgue de saudade toda vez que o teu sorriso fugir dos teus lábios. Portanto, eu estou completamente preparado pra gente conversar sem querer sobre qualquer assunto, só pra poder ficar um pouco mais com o outro. Deixar o tempo passar com a gente junto e depois jogar a culpa no tal “destino”.

Eu tinha evitado encontrar os teus amigos pra não ficar ouvindo o falar de você. Mas quando todo mundo ta junto é uma energia tão boa, que e a gente até entende as piadas quando pegam a gente se olhando. A gente se respeita pra não se amar, a gente perdeu a mão da corda. E agora ficamos com esse medo. A gente queria que a corda continuasse esticando. E agora a gente ta com medo besta dessa corda dar um nó. A gente morre de medo de ficar sufocado. Imagina um pelo outro, que perigo.

Então, com a minha última taça de vinho na mão eu criei coragem pra te ligar. Na verdade, queria te contar que acabei ganhando alguns ingressos pra ir naquele show que você queria ir naquele sábado depois do dia dos namorados. Aliás eu ainda lembro de ti, só de ouvir a introdução daquela banda. Tava pensando se a gente não  podia se esbarrar por lá. Deixar tudo em segredo e se alguém perguntar a gente coloca a culpa no acaso. Toda frase fica bonita com ele. Depois a gente fala que deu a tal faísca, suas amigas adoram essa palavra. E a gente acorda sem querer na cama do apartamento aqui de casa, que tal?

E você nem conheceu meu apartamento novo. Tá uma graça. Como vim pra cá faz pouco tempo, vou tentando deixar bem a minha cara. Pra ficar de um jeito que você tenha vontade de ficar, quando vier me visitar. As cortinas chegam nessa semana. E eu também deixo uma chave dentro da mangueira de incêndio pra caso você perca a sua e precise de um abrigo. Lembra que você me deu essa idéia? Aproveita que tá frio e desfila pela minha casa vestindo algum casaco meu só pra ficar parecendo um vestido em você.

Pronto, já cuspi minha saudade e agora to torcendo pra que você não veja sua caixa de mensagens. Só que essa minha covardia um dia me faz te perder de vez.

Que saudades tuas.

Se cuida.

Um beijo.

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autor_jorge

quase deu

Ela só rodava o celular. Brincava com a película e não sabia se tirava ou se deixava ela ali mesmo que ela atrapalhasse sua visão. Pelo menos protegia. De alguma forma era só isso que ela queria no momento. Um pouquinho de proteção. Abriu a foto dele e ficava sorrindo aquele sorriso besta, que a gente não controla. Abriu a conversa entre eles e tentou escrever. Escreveu e apagou. Apagou e voltou pra foto dele. Não enviou nada. Quis deixar a vontade de conversar com ele passar. Ela só não passou.

Ele em um outro canto da cidade, terminava seu dia no trabalho. Entrou no carro e ignorou todas as conversas e grupos. Correu até a janela dela. Queria perguntar como tinha sido o dia dela, só pra poder contar como foi produtivo o dia dele. Olhou o horário e achou que ela talvez não fosse olhar. Pensou que pudesse atrapalhar a aula na faculdade ou o trânsito pra casa. Correu pra foto dela e pensou se aquela noite entre eles ia se repetir outra vez. Cheio de coisas pra contar ele preferiu guardar pra mais tarde. Guardar pra mais tarde, em alguma língua nativa, deve significar esquecer. Esquecia o assunto mas não esquecia dela. Mas resolveu não falar. Não naquela hora.

Naquele pequeno espaço entre a cama e o armário, ela já tinha dado, no mínimo, umas trinta voltas. Queria ignorar o clichê do que todas as amigas falaram. Queria curvar o orgulho e puxar um assunto. Perguntar se ele estava bem, torcendo pra que se não estivesse, ela fosse um bom motivo pra melhorar. Queria trocar a almofada cor de rosa onde repousava a cabeça, pelo jeans surrado dele que viria acompanhado de um cafuné. Mas tudo isso só poderia acontecer se ela não o procurasse. Afinal, nesse mundo onde todo mundo é o senhor da razão, querer matar a vontade de um sorriso pode soar errado.

Todos os amigos dele já sabiam dela. Aquela história que ele tinha tanto orgulho de contar, que não se importava de começar desde o início a cada amigo novo que chegava no futebol. Começa bem do comecinho, pra não perder nenhum detalhe e tentar lembrar sempre de mais um. Falava o tempo todo dela. Só não falava com ela. Se o mundo não julgasse tanto, mandaria bom dia e boa noite, até chegar o dia em que ele só precisasse rolar o corpo pro outro lado da cama e sussurrar no ouvido dela. Não parece tão difícil, bastava o ego dele permitir ele utilizar a palavra saudade quando tivesse vontade.

Então no meio do frio cada um se aquecia como podia. Ela nas cobertas. Ele nas garrafas de uísque.  Ele desejando poder contar pra ela o quanto a mãe dele suplicava para que ele encontrasse alguém. Ela podendo dizer pras amigas que encontrou um cara diferente de todos os outros. Queriam ligar no dia seguinte. Mas não existe meio termo entre fofura e chateação. Príncipe meloso ou vagabundo cheio de cuidado. Não no mundo deles. Nem mesmo no mundo que criaram pra eles. Então eles continuaram se olhando e não se falaram. Deixaram o tempo que cura tudo, curar o tesão. Deixaram esfriar o tal desejo. Até o dia que se reencontraram. Já não tinham nem saudades, muito menos assunto.

O “Oi” e “Tudo bem?” pareciam uma eternidade.

E o mundo, sem mexer um músculo e impondo suas regras medievais acabou de pulverizar mais um casal.

Que pena. Quase deu

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autor_jorge

exergando de longe

Engraçado como a distância brinca de nos fazer esquecer.
Como alguns quilômetros podem nos fazer perceber que, às vezes, é preciso ver de longe.
Às vezes precisamos nos afastar.
E isso não traduz falta de coragem ou medo de encarar, significa respeito pelo que ainda há de bonito.
Preservar, intocado, num canto seguro do coração. A insistência causa ferida e, a ferida, demora a cicatrizar.
Gosto de me sentir livre.
E não consigo pensar em amor sem pensar em liberdade.
Tem que ser muito livre pra escolher ficar com alguém. E tem que ser mais livre ainda pra saber a hora de partir!
Entender que não dá certo é, sobretudo, respeito ao amor.
Quando você decide seguir em frente, não está apenas indo, não está abandonando a outra pessoa. Pelo contrário, está dizendo que ela também deve viver e ser feliz.
Se todas as pessoas soubessem a hora de partir, não haveria tanta mentira travestida de sentimento.
O cara não ama, mas tá lá, com a aliança no dedo e as outras no stand by.
A mina não quer mais, mas o cara é bonzinho e paga a conta do restaurante que ela gosta.
Além de ser cruel com quem realmente ama, é burrice.
Pra que mentir?
Qual o ganho de se manter numa relação unilateral?
Chega, bora viver, bora dar a cara a tapa. Vamos assumir quem somos, o que sentimos, o que queremos.
Chega de fazer outras pessoas de tapete, de degrau.
A vida é bonita demais pra ser vivida pela metade. As pessoas merecem saber nossas intenções.
Se é uma noite, que seja uma noite.
Se é pra vida inteira, que seja inteiro.
De metades o mundo já tá cheio!

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autor_kamila

cortinas fechadas pra você

Outra vez você desce da minha cama enquanto eu ainda tô lutando contra a minha preguiça. Pra seguir o teu roteiro clichê, você senta quase que no pé da cama e acaricia as minhas pernas bem devagar. Eu ainda meio confusa e um tanto quanto sonolenta, coço meus olhos com o punho cerrado. Quero te admirar pela manhã, mas os raios de sol que ultrapassam a cortina já me incomodam bastante. Você me dispara um sorriso amarelo, que já vem no seu pacote de “palhaço-ao-amanhecer”. Bagunça ainda mais o seu cabelo e levanta pra começar a se trocar. 

Ainda é sábado, bem cedinho, mas eu já tenho todo o roteiro desse filme. O final é uma comédia pra você. Um drama pra mim. A voz que a poucas horas balbuciava um “eu te amo”. Agora já é trilha de algumas desculpas tão vagas que nem foram elaboradas ainda. Sua avó adoece pela zilhonésima vez. Seus pneus descartáveis vão furar. Minhas ligações se forem feitas depois das oito, serão atendidas apenas na quarta tentativa. Tô estrelando o meu melhor papel diante da tua apresentação. O de idiota.

Eu faço uma voz de menina indefesa e você me abraça me fazendo acreditar que você é o próprio Hércules. Me sinto totalmente presa, segura. Tento pausar o filme pra poder ficar naquela sempre por toda a minha vida. Mas você esfria e desacelera. Me beija na testa e diz pra eu me cuidar. Eu te acompanho até a porta, você tentando desviar o olhar do celular para responder o seu grupo de amigos e tuas outras pretendentes. Eu me sentindo no corredor da morte. Você saindo pela porta sabendo que pode voltar quando bem entender. Eu desolada sabendo que me deixei levar pela emoção e só vou te ter nos meu lençóis quando for tua única opção.

Você diz que quase falamos a mesma língua. E que nossos sentimentos são os mesmo, só mudamos algumas formas de falar. Pois é, são sim. Eu te chamo de apoio. Você me chama de encosto. No final é tudo a mesma coisa, só depende da perspectiva de quem fala. Nessa receita roteirizada, você invade a minha sala com o cabelo molhado da chuva. Me abraça me pedindo uma toalha só pra eu poder reviver todas as minhas memórias com você em dias assim. Mistura teu perfume com o meu e depois desaparece. Como você é burro de me destruir todo dia um pouco. Como eu sou tola de amar ser destruída por você.

Acontece que ótimas trilogias, por melhores que sejam, uma hora chegam ao fim. Blockbusters e vencedores do Oscar também. Séries acabam um dia. Cada um do seu jeito. Algumas por falta de expectadores. Outros por problemas entre os atores com a direção. Alguns simplesmente terminam pra não manchar a imagem. Então diferente das outras vezes minhas cortinas se fecham, como outros palcos já fizeram pra ti. Agora só me resta aguardar o tempo dizer se abrirei pra você um dia outra vez. Talvez por falta de outros espetáculos. Mas talvez eu crie vergonha no meu palco e procuro algum show que seja digno dos meus espectadores.

O seu é excelente, mas já assisti milhões de vezes.

E eu sempre choro no final.

Cansei.

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autor_jorge

 

temos vaga

Já fiquei perdido no meio dos teus anúncios, tem vez que é procurando por companhia. Outras é se amargurando de saudade. Mas por favor, me explica como sente falta do que nunca teve. Não entendo como as pessoas se apegam em lembranças que não são delas. Vejo o teu rosto, desgostosa com o que lhe proponho, mas por muitas vezes te assisti projetar o funcionário dessa forma. Ou está maneira não é do seu agrado ou tu não sabes o que pede. Fica perigoso quando nem a gente sabe o que quer, não é?

Tô enviando os meus dados pra cadastro levando em conta a tua procura no mercado. Talvez eu tenha entendido errado ou talvez a sua procura esteja um pouco confusa. Não ofereço carinho, mas ofereço um bom drink iluminado pela luz de um globo. Troco a conchinha por ressaca. Mas acredito que tudo dentro desse teu planejamento. De acomodar teus melhores talentos. Enaltecer algumas pessoas que acabaram de chegar. Quando a gente olha pro umbigo não quer dizer que estamos olhando pra dentro, ta?

Me contrata sem muitas perguntas, se possível, sem dinâmica. Raramente sei me comportar nessas situações. Essas coisas de testar o jogo de cintura, de ser pressionado sobre um assunto que eu ainda tento conhecer. Me contrata e depois me questiona. Vê se eu não preencho teus requisitos. Uma boa conta bancária, belo carro e um corte de cabelo dentro da moda. Vocabulário levemente limitado. Porém, nada que atrapalhe, muito menos, que preencha o coração. Mas isso você já sabia, não? Quando preenche o coração da gente, os outros requisitos nem tem tanto peso assim.

Talvez o meu problema esteja em não ser muito bom nessas indicações. Andei ouvindo por ai, que muito opina quem pouco lhe conhece. Que qualquer semana virou anos. Colegas da vida. Amigos do trabalho. Inversamente corretos. O problema é que do lugar de onde eu vim, conselho é uma coisa. Influencia é outra. Aconselho a tomar cuidado. Pra não influenciar na gargalhada da tua solidão. Existe estar só por opção. Diferente da opção de estar só. Depende da tua opinião. Quando digo tua, espero que não repita o que acabou de ouvir. Sinopse não te conta os detalhes do livro. A gente se apaixona nos detalhes lembra?

Mas depois de tanto falar, não sei se sou o que você procura. Na realidade não sei se realmente tenho perfil para a vaga. Só preciso de um amor. Não da mesma forma como eu preciso de dinheiro. Você precisa de atenção. Se a gente não precisa das mesmas coisas, íamos precisar um do outro? Talvez não. Tornei-me um bom funcionário sem ter seu nome nas minhas experiências. Da mesma maneira que ela sempre foi gigante sem os meus serviços.

Obrigado pela oportunidade.
Até breve.

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autor_jorge

 

 

 

explica essa foto

Explica essa foto. Não a sua última, que se tornou a nossa saideira. Essa aqui, perdida no meu celular. É você capotado na minha perna. Dormindo como se fosse um bebê que não quer sair do berço. Dormindo e suspirando devagar, quase que dizendo que não quer parar de sonhar. Controlo você com uma mão. Que acaricia o teu cabelo devagar. Você ronrona que nem um gato manhoso. Que gato. Maldito gato. Se você miasse talvez eu ainda pudesse cuidar de você, querido.

Pode explicar essa talvez, essa que eu odiei na época. Dessa foto que com tão pouco, falava tanto sobre nós. Eu falei que estava péssima e você soltou uma gargalhada. Me deu um beijo na testa e me agarrou com um braço só. Disse que não existia lente em nenhuma câmera desse mundo que tire a minha luz. Que a sorte era dele de ter um ponto focal na foto que nem eu. Postou. Apertou o afago e me beijou devagar. Eu quase sinto o teu gosto toda vez que eu olho essa foto outra vez.

Tive que trocar essa foto nossa que a gente decidiu deixar em preto e branco. Era uma das minhas favoritas. Aliás, era tão nossa que ela nem queria sair do porta retrato quando fui trocar. Colada. Que nem a gente era. Mas de uma forma natural, como se o tempo fosse fazendo questão de a gente se parecer uma coisa só. Daqueles que não se importam em começar uma frase sentido por saber que o outro vai completar. Mas pouco a pouco ela foi se desgarrando. Naturalmente. Igual nós dois.

Tem a foto do fim de tarde que a gente ficou assistindo naquele feriado. De uma tarde tão boa juntos, que dava vontade se ela durava um pouco mais. Pra ela continuar assim, verdadeira na luz do sol. Verdadeiramente parecido com a gente. Daquelas tardes onde a gente concordava em tudo sem dizer uma palavra. Quando o andar fica igual. A direção é a mesma quando a gente quer a mesma coisa. Que a gente fica até meio sem rumo quando não tem outra sombra do lado da nossa. A foto só tinha a nossa sombra. Como me fez feliz aquela sombra. Mas aquela tarde foi embora, como todas as outras. A sombra também.

Minha última fotos sem explicação, era só minha. Mas tirada da tua mão. Confiante e corajosa eu encaro o outro lado da paisagem de quem me olha. Eu tinha uma paisagem linda sem você no meu campo de visão. Eu já era mais do a sua paisagem. Tanto que você quase me enquadrou. Um pouco além daquela foto. Foto linda. Como você fazia isso bem. Como me viu bem. Como me fez tão bem meu bem.

Foto faz a gente lembrar do que a gente viveu num momento que a gente não quer esquecer. Foto é uma forma todo dia pra gente, como eu queria poder encostar nela outra vez. Se eu não fizesse tudo diferente. Sei que a única coisa que eu pudesse guardar eu guardaria. Como eu guardei essa foto. Como eu guardei você.

E como eu ainda não sei explicar.

Explica?

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teu frio

Hoje quando eu acordei, pensei em alguma maneira de negociar com os deuses para não ter que sair da cama. Pelas frestas da minha janela, o vento soprava bem frio. Quase sussurrava o nome dela. Eu, dentro das minhas cobertas, continuava quente.  Protegido do frio. Protegido de você. Talvez protegido do teu frio. Hoje a última coisa que eu queria era encontrar com teu rosto pela rua. Não por ti. Por mim. Então, do meu jeito atrapalhado, eu fujo do teu frio.

Complicado e bem cômico. Eu adorava o frio, até o dia em que eu resolvi adorar você. Eu sempre muito quente. Você gelada que chegava a doer. Oposto e vivíamos em perfeita harmonia. Juntos, éramos a temperatura ideal pra consumo. Daqueles que se completavam. Que combinavam em tudo. Nunca fui muito bom de química, mas tenho certeza que combustão era algo parecido com o que acontecia quando nossos corpos se tocavam durante a madrugada.

E deu certo. Você acalmou e congelou todos os meus fantasmas. Eu fervi todos os teus medos. Fiz de você exatamente tudo que eu sempre sonhei. E no teu semblante sempre frio, eu esquentei o teu sorriso. Aliás, menina, como era bom te fazer sorrir.  Como era bom saber que meu calor era o motivo do teu sorriso. Consegui derreter teus olhos pra que eles despejassem lágrimas de emoção. Eu consegui.

Consegui ser tão feliz na tua temperatura, que quase me esqueci do meu próprio calor. Mas a gente é assim. Quando não entende alguma coisa, prefere procurar um culpado ao invés de uma solução. Fica perdido, confuso. Gela demais. Ferve demais. Não consegue entender o que aconteceu, mas não consegue esquecer que viveu. Desdenha do peixe que colocava na mesa todo santo dia. Cospe no prato que comeu, pra mais tarde contar pras paredes do quarto o quanto queria comer no prato que cuspiu.

Então eu cubro o meu corpo todo. Dos pés até a cabeça. Entrelaço minhas mãos quentes e faço uma simples oração. Peço proteção pro teu frio. Pra tua cara de brava. Pro meu calor exagerado. Peço paz pro teu coração e peço delicadamente para que você vá embora do meu. Pra gente poder se encontrar lá na frente com o mesmo espaço e carinho de quando a gente se conheceu. Pra que eu possa intensamente esquentar outros corpos e ser feliz. Pra você esfriar caldeiras borbulhando e gozar em paz. Pra que a gente possa parar de querer se odiar, por puro medo de amar.

Amém, meu bem.

Nosso bem.

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