eu não tenho medo

Eu não tenho medo. Já tive, hoje não.
Lembro daquele dia em que não quis sair na rua por medo da chuva, de desfazer o penteado, escorregar, cair do salto. Por isso, não fui. Ainda houve aquele outro dia, no ano seguinte: Eu me sentia velha, não queria trocar a cama, os livros e a segurança do meu quarto por algo inesperado. Me guardava sem saber pra que. Ou pra quem. Embora o amor e todas as suas incertezas ainda me assustem, metades me apavoram. Hoje gosto de eternidades. E o meu conceito de eternidade tem menos a ver com tempo do que insinua o dicionário.

O eterno pode ser apenas um olhar, algumas horas, até o fim da vida.
Amor é carnaval! A comissão de frente deve ser anúncio de maravilhas. Sozinha, não tem valor.  Não estraga. Por favor. Se teu olhar for seguro, eu seguro tua mão feito porta bandeira: com firmeza, certeza e felicidade explodindo pelo sorriso, pelo semblante.

Eu te percorro com a boca! Feito samba enredo eu te canto, e cedo ao teu encanto sem receio do final.
Afinal, meu bem, o carnaval chega ao fim, claro que sim.
Quarta feira de cinzas vem pra mostrar que o melhor, o mais bonito, o mais intenso, também pode acabar.

Mas não tenta me enganar, ludibriar minha visão. Eu sigo teu ritmo, embalo no teu samba, te deixo tocar meu coração.
Viro tua passista, destaque da tua escola, rainha da tua bateria.
Só peço que seja leal durante o nosso tempo na avenida.
Eu posso até pular carnaval sem me importar com a chuva. Mas depois, meu amor, vem o frio, e este, é impossível de ignorar.
Não seja chuva, seja alegoria que enfeita minha vida, vai embora da avenida mas, alguma coisa, sempre fica.

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autor_kamila

mais um dia bom

Ainda que meu dia tenha sido uma loucura, eu tenho que confessar que ainda fico de uns dias pra cá esperando o momento de começarmos a conversar. Tô naquela fase confusa, onde todas as minhas parábolas do dia anterior eu praticamente dividi com você em tempo real. Falamos por horas, que não sei se começo a falar contigo no outro dia ou se espero pra ver se já não te saturei com meus devaneios. E então cê me diz “oi“. Obrigado. Meu dia começa, tenho um caminhão de coisas pra te contar. Só que pra minha felicidade, cê também tem. Tropeçamos nas nossas próprias histórias umas quatro vezes, você sorriu em todas. Que sorriso lindo, diga-se de passagem.

Nos outros dias minhas dúvidas vão ficando cada vez menores. Não deixei de achar graça em nadas, nem vou lhe dizer que seu abraço tirou o sentido de todos os outros. Mas o mundo parece mais interessante quando cê concorda com todas as minhas loucuras. Não tenho quase nada pra dividir, mesmo assim, cê encosta a sua cabeça no meu ombro e diz que eu te somo. E realmente, fazia tempo que alguém não acrescentava tanta coisa boa no meu dia. A minha mesa de estudos, tentando entender esse fenômeno de sentir uma alegria descomunal dentro de mim com qualquer conquista tua. O mais próximo que cheguei foi “carinho”. Morena, anota ai: Tô transbordando de carinho pra ti.

Antes as coisas não estavam chatas, não vou ser clichê e dizer que tudo era cinza no meu dia antes da tua morada. Mas gostei muito do trabalho que você faz com as cores que já existia dentro do meu peito, esse processo de tratamento de imagem e restauração de um ego. Misturei tons de vermelho com esse teu abraço, que só laça o meu pescoço na ponta do pé. Peguei algumas pinceladas de verde pra acompanhar a tua mão quando repousa na minha. Pouco a pouco você veio retocar os traços que alguém não terminou, por desleixo ou por preguiça. Agradeço o teu passado por mim, as feridas deles te ensinaram exatamente aonde pisar na nossa dança. Nosso dois pra lá pra dois pra cá tá sincronizado. Tão sincronizado que a gente já deu alguns giros por aí.

Li acompanhado de alguns braços entrelaçados, já escrevi pra outros, já sentei do lado de muita gente antes de pegar essa estrada, já enxerguei o horizonte sumindo e aparecendo de muitas formas diferentes.  Algumas companhias ficaram por bastante tempo, mesmo com os olhares tão diferentes do meu. Outras o suficiente, com olhares que eram exatamente iguais. Fui sempre muito extremista nas minhas coisas. Seja igual ou não seja meu. Tive que descer do salto e aprender muita coisa na marra, tive que ter paciência pra ensinar muita gente. Teve gente pra caralho, pra falar a verdade. Não encontrei e acho que nem tenho tempo um tipo de pessoa especifica pra mim. Mas se tivesse, tenho que confessar que seria parecido com você.

Um dia você vai descobrir que eu não sou bom com datas e tenho uma enorme facilidade para negar oportunidades. Gosto de abrir portas e você quer entrar em todas. Meu time é de outra cidade. O teu joga embaixo da janela da minha. Teu gosto musical bate tanto com o meu que quase te esbarrei em algum bar pequeno daquela banda que ninguém escuta. Mas talvez lá eu não te me encantasse tanto por ti. Talvez lá eu te dissesse que sou da capital e você respondesse que é do interior. Essas coisas que a gente tá acostumado a falar pra afastar pessoas óbvias do nosso caminho bagunçado. Mas deixa assim. Não mexe, não rotula e nem inventa moda. Aproveita, se entrega e me dá a mão. Não se dá fim quando não se tem começo. Quando for pra acabar a gente começa. Ou então começa pra não acabar mais, meu bem.

Hoje talvez não, mas ainda pipoco na tela do seu celular e te faço sorrir com um bom dia, menina. Que nem cê tem feito comigo de uns tempos pra cá.

Obrigado viu?

pei

autor_jorge

tenha paciência, meu bem

Querida,

Dia desses, você me bombardeou de perguntas que eu realmente não sabia como responder. Não eram perguntas complexas, ou que exigissem alguma formação especifica na minha vida. Exigia que eu já tivesse vivido. Que eu já tivesse realmente amado. Que eu já tivesse sofrido por um amor que fugiu dos meus abraços e me fez passar o final de semana com a mesma roupa por não querer sair de casa. Por ter preguiça de me olhar no espelho. Você me assustou.

Assustou-me, pois naquele dia eu descobri que eu morro de medo de mulheres como você. Garotas que não tem papas na língua da vida. Que se despenteiam na rua, nas festas e no sexo. Que ficam bem vestidas de camisa larga, que usam tênis nas baladas onde as pessoas usam salto. Que não tem vergonha de pedir carinho e que nem tem medo de dar bronca. Tenho medo de independente.

Preocupei-me, por não saber como lidar com as perdas da minha vida. Por realmente não ter escutado elas lamentando as feridas que eu causei. Por ter desregulado possivelmente alguma grande mulher nessa minha caminhada e não ter tido o famoso “culhão” de me desculpar. Você que está sempre no alto da vida, que lidera a mesa do bar falando dos assuntos com uma segurança incrível, que lê livros em outras línguas e assiste aos filmes indicados ao Oscar só pra prosear com algum amigo especifico. Você longe de tudo, inclusive de mim, ajoelhou e pediu ajuda. E eu tremi.

Então eu parei, refleti e descobri que não estou sozinho nessa caminhada de fujões. Desses que traçam objetivos, articulam estratégias e chegam aos pontos desejados graças ao bom planejamento que vendemos aos amigos como flerte ou conquista. Balela. Das bravas. Empresas com planejamento atingem metas, clubes com planejamento conquistam títulos, homens com planejamento alcançam as mulheres desejadas. O problema é quando o plano cruza com um concorrente desleal. Intelectual, agradável, com bom perfume, andando sob o salto e com um batom que combina com a sombra.

Ainda não descobri o motivo dele ter te abandonado, dele ter cantado tuas musicas preferidas e não ter lhe avisado de qual delas seria a saídera. Mas provavelmente você o desesperou. Tem que ser muito homem pra aceitar que temos que caminhar muito e humildemente até aprender tudo o que mulheres como você, gentilmente querem nos ensinar. Que vocês se cobram muito, por muitas vezes saberem muito mais dessa vida do que a gente, mesmo assim,  insistimos em fugir pra não aprender. Espero que você tenha chorado bastante, ate toda essa tua incompreensão pessoal tenha sido expulsa em lágrimas.

Depois você levanta e olha no espelho, faz uma maquiagem daquelas lindas, que só você sabe fazer. Respira fundo e tenta realinhar a tua paz. Na hora que você conseguir deixar tudo no lugar, você vai entender que tem uma fila enorme de homens que adorariam aprender sobre a vida com você. Desculpa a infantilidade, você é um mulherão e tanto. Tenha paciência pra ensinar.

Beijos.

Bom carnaval.

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autor_jorge

que bom

Que bom que a gente sentou na mesma mesa, que os nossos amigos conseguiram alinhar nós dois naquele dia. Que bom que aquele meu relógio branco enroscou na tua pulseira e fez a gente passar alguns minutos sorrindo sem falar nada um pro outro. Que bom que você não tem vergonha pra descer do salto e sambar descalça do meu lado. Que bom que você acertou o nome do meu perfume. Que bom que você apareceu no meio dessa confusão toda que andava a minha vida. Que bom que além de desse abraço que parece eterno você ainda é minha melhor amiga. Que bom mesmo.

Vi tantos rostos passarem diante do meu, alguns ficaram por mais tempos que outros. Outros passaram tão rápido que eu não me recordo de nenhum traço sequer. Alguns ficaram por muito tempo, mas alguma hora eles sempre tentaram me modificar. O seu único pedido pra mim é que eu seja sempre assim. Que eu seja o mesmo. Sempre. Eu penso diferente de muita gente. Você pensa incrivelmente igual a mim. E talvez a gente não mude pelo fato da gente se completar bastante com esse nosso jeito diferentemente igual.

Eu queria poder ter você por mais vezes no meu dia. Talvez sem falar nada, só do meu lado mesmo. Pra poder repousar a cabeça no seu ombro enquanto soluciono minhas dúvidas. Não são apenas as tuas palavras que me fazem bem, teus conselhos tem dado muito certo desde que você entrou na minha vida. Um dia ainda decifro esse teu poder de hipnotizar pessoas sem dizer absolutamente nada. Meu amor, eu escreveria um livro com todas as nossas conversas de olhares.

Diferente do mundo eu não quero mudar nada nosso. Não quero falsos abraços de boa sorte. Nem quero desejos de felicidades recheados de segundas intenções. Quero do jeito que está. Eu e você, aquela tua televisão antiga e aquele sofá velho. Um domingo com teus pés apoiados na minha perna, daqueles que a gente vai revezar os beijos com cochilos. Desses em que  todo mundo diz que a gente sumiu e eles não fazem nem ideia do quanto a gente queria sumir de verdade mesmo, mas só nós dois.

Então eu não quero apagar passado, não quero ignorar cicatrizes. Quero que as coisas continuem do jeito que estão. Com esse nosso toque de “não sei se é pra sempre, mas bem que poderia ser.” E um dia a gente pega todos os nossos fantasmas do passado, adiciona no mesmo recipiente que a opinião dos outros, amarra junto com as nossas contas que ninguém pagou e parte por esse mundo pra fazer piada de tudo. Pra acordar numa barraca em alguma praia que a gente não conhece. Mesmo que você esteja em silêncio, você vai me dizer absolutamente tudo que eu precisar ouvir.

Que bom que você está aqui.

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autor_jorge

encantadoramente ao contrário

Tudo conforme o nosso combinado. Tudo do jeito que a gente sempre acreditou que fosse ser pra gente. Tudo como era esperado. No meio da semana, numa noite quente no meio da cidade que não dorme. A pergunta vindo do meu lado, ansioso e intenso. Que quer abraçar o mundo mas que não consegue abraçar você. Do teu lado, o mesmo sorriso apaixonante, o cabelo preso no descaso, aquele teu rabo de cavalo meio de lado, você no seu pijama e rolando de lá pra cá na cama do seu quarto. Recebe a minha pergunta já rindo e que não esperava. Nem te chamo pra sair e já recebo um não. Tudo como sempre foi, tudo de cabeça pra baixo.

Você é a aquela nota musical que eu ainda não alcancei. Nota que eu talvez morra sem alcançar. Que eu desisto de buscar, mudo o timbre. Mudo os instrumentos, as letras e os tons. Tudo diferente pra não ter que te buscar nunca mais. Mas vez ou outra, me pego sozinho no meu quarto. Sem folia mas também sem o teu retrato. Os acordes naturalmente se encaminham pedindo que eu depois de tanto tempo volte a te buscar. Eu tento, dessa vez quase consigo. Cantei como nunca, não te alcancei como sempre. Normal.

Fiquei fuçando os bares da cidade, os amigos e os casais. As casas noturnas e os restaurantes. São Paulo tem dessas coisas, na mesma rua, cortando ela de ponta a ponta, a gente atravessa todo tipo de sentimento. Tudo que é tipo de intensidade. Tem gente pedindo carinho, gente pedindo dinheiro. Tudo isso no mesmo semáforo. E eu só queria você, um banquinho embaixo de uma árvore e a madrugada toda pra poder te abraçar. É pedir muito?

Te procurei do nada, com um caminhão de mudanças quase estacionado na garagem da tua casa. Prontinho pra descarregar. Toda a minha mudança que eu juntei nesse tempo que a gente não abraçou, sabe? Aquele nosso abraço, que parece que a gente ensaia a cada dia junto com a saudade. Encaixa tão bem. Tive muito problema na minha vida que eu nem te contei e você já me respondia me abraçando. E era exatamente o que eu precisa ouvir.

Então meu bem, desculpe o horário ou o efeito dos baldes de cerveja. Desculpa pelo corretor que nem corrige e nem desembaralha minhas palavras pra você quando eu ainda insisto em te procurar. Eu queria que você soubesse que a tua ausência me fez um bem enorme e me fez crescer muito. Que depois desse tempo todo eu ainda te pego pela mão e te levo pra ver o sol nascendo numa praia que você não conhecesse só pra gente poder chamar de nossa. E que se tem uma ligação perdida no meu telefone que eu me amargo de nunca ter atendido, foi aquela que vinha com teu nome.  Prometo que um dia eu alcanço a tua nota, nem que seja do avesso.

Mas tudo sempre foi assim, pelo menos com a gente, encantadoramente ao contrário.

 

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autor_jorge

eu não cabia no seu peito

Eu paro por aqui pelo meu próprio bem. Pelo nosso bem. Paro até mesmo pelo seu bem, que nos próximos dias você vai chamar de amargura. Mas paro para poder lembrar bem desse teu sorriso de malandro, desse seu cabelo bagunçado e desse abraço caloroso que você tem. Vou fingir que não estou enxergando essas atitudes infantis que você tem tratado como normal. Paro pra você me chamar de imatura, mas lá na frente entender que ninguém merece teus surtos.

Eu me encantei gradativamente por você. Por mais que teus olhos azuis fossem um atalho para toda a perdição eu realmente fui me encantando as poucos. Primeiro foi a mão na cintura quando nos apresentaram. Me pegou firme, me puxou junto ao corpo. Um beijo na face e um abraço firme. Encaixou perfeitamente todas as minhas peças sem encaixe. Mas você poderia me avisar no começo que depois de um certo tempo de uso, eu passaria a deitar na tua cama ao lado do homem perfeito e acordar com um garoto de seis anos. Mimado e birrento.

Já não tenho mais paciência pra inúmeros jogos nessa vida: A tranca da minha avó nos domingos, os que me enviam vidas pelo Facebook e os teus. Queria que você vestisse essa armadura que você usa nas baladas quando estivesse um final de semana todo comigo. Esse homem seguro e que sabe um pouco de tudo. Que me enchia de filmes e beijos, não o que me enche o saco.

Você bate a porta da minha casa e eu bato a porta do teu carro. Eu escrevo pra revistas e você ainda marca com giz a parede de casa quando alguém resolve se medir. Eu exponho as minhas idéias e formas como eu vejo o mundo. Você prefere expor a nossa felicidade como se fosse um roteiro de viagens. Eu ainda ando preocupada com o conteúdo dos comprimidos e seus efeitos colaterais. Você só quer um bom rótulo que já está bom.

Eu enxerguei seu coração de longe. Tentei preenche-lo, só que eu era grande demais. Tentei repousar em você, mas você amanhecia pequeno. Gritei mas você não ouviu. Chamei e você não olhou. Te olhei por fora e não te alcancei. Tentei entrar e te transbordei.  Desculpe querido, eu não cabia no seu peito.

Um dia você cresce.

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autor_jorge

só pode ser eu e você

Algumas vezes eu paro para pensar se mereço o seu carinho, o seu elogio, o seu sorriso…o seu coração. Sempre acreditei que o amor era possível, independente da forma que ele fosse aparecer na minha vida. E ele apareceu no seu corpo e na sua alma que me conquistou e cativou o que há de melhor em você em mim.

Tenho até medo do que está por vir, porque nós dois juntos somos o rabisco que se tornou em algo marcante, em algo que me transformou. O teu jeito cativante de ser imperfeito me traduz o que é a admiração. O teu cheiro me traz a lembrança de sonhos que tive sem nem saber que você seria a realização do que estamos vivendo.

Acredito que os nossos caminhos se cruzaram para eu te fazer feliz e para você me mostrar o mundo. O seu mundo particular que é coberto de vida, de luz e charme de ponta a ponta. Acho que estou me transformando, evoluindo, porque muitas vezes fico surpresa com as coisas que falo para você ou escrevo no silêncio do meu quarto. Tenho medo de algo acontecer e eu nunca conseguir superar que o destino não nos queira sermos um para o outro.

Você me fala com toda a certeza do mundo para deixar de besteira e não pensar nisso. Me acorda com um beijo na testa e em seguida vai sonolento tomar banho. O cheiro da sua pele invade nosso quarto e você volta para o aconchego dos meus braços. Suas palavras são traduzidas em cada olhar que você me dá. Chega até a me assustar o quanto eles traduzem o seu sentimento por mim. Eu vejo a verdade neles e isso me conforta de um jeito inexplicável.

Isso só pode ser amor. Não é possível que seja outra coisa. A não ser que tenham inventado outra palavra para isso, eu quero que fique bem claro o quanto nasci para você.

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autor_helena

prato parado esfria rápido

Todo mundo falando o que eu deveria fazer, toda as outras vozes do mundo me cantando exatamente como eu não deveria me portar. Só que eu, birrento como você conhece muito bem, preferi contrariar a todos. Preferi alimentar meu ego ao invés dos meus ouvidos. Separei todos os seus ingredientes preferidos, cozinhei exatamente da forma como você sempre gostou. Arrumei a sala daquele jeito que a sua mãe deixava quando passava uns dias em casa, por saber que era a forma que você adora. Abri aquela louça que ganhamos da sua amiga e nunca usamos. Postei a mesa exatamente igual aquele filme, botei seu prato, ajustei o relógio arrumei o meu cabelo. Sentei do outro lado da mesa, acendi a vela no centro e esperei o seu prato esfriar.

Degustei amargamente cada garfada daquela noite sozinho, batizei cada taça de vinho que eu enchia com o seu nome, pra que eu lembrasse muito bem quando tivesse uma ressaca de “você” na manhã seguinte. A vela apagou sem que eu precisasse ter dado um sopro. Joguei o seu prato no lixo e ainda tentei olhar mais uma vez no celular se existia algum rastro teu. Sem avisos, sem companhia e sem sinal. Paguei cada centavo da minha teimosia, segui a minha intuição e ignorei a maioria dos conselhos. Seguir o coração não deveria cegar nossos olhos e tampar nossos ouvidos. Enxergamos com dois olhos, ouvimos com dois ouvidos e amamos com um coração só. Olhos e ouvidos além de ser maioria diante do coração, são pares. São dupla desde o início da vida e sempre se entenderam muito bem.

Eu nunca soube lidar com problemas pequenos, minhas turbulências sempre foram intensas. Talvez esse seja o tal buraco que eu não sei lidar, qualquer brisa que bate no meu rosto é ventania. Ao invés de superar problemas pequenos com sorriso no rosto, eu prefiro agigantar todo o mimimi até que ele consuma todo meu bom humor. Eu te aumentei até quando você se tornou um problema na minha vida. Consegue entender, que eu te faço grande até quando você me faz mal?

Não tenho esses corações modernos, que são acostumados com abraços congelados. Esses que qualquer requentada satisfaz. Cresci com os pés descalços e brincando na rua. Quase não parava de almoçar, mas sempre tive um bom paladar. A comida feita naquela panela de barro da minha avó sempre foi muito mais saborosa do que esses congelados que aquele teu velho microondas  esquentava pra te agradar. É uma visão diferente, mas o prato são iguais. O preparo é que faz a diferença no sabor. Só que pra ter amor no prato, tem que preparar com carinho e não com ausência.

O segredo está em todos os pontos, em todos os processos. A receita que eu segui foi a dos filmes, do jantar apenas com a chama de uma vela e você linda na outra ponta da mesa. Você o clichê do mundo de ignorar quem queria cuidar de você. Preparei como no meu sonho, de abrir a porta do carro. Você abriu a garrafa e preparou o seu copo,  junto ao das tuas amigas. Eu esperei o seu prato esfriar e lentamente degustei o meu também. Ficou na temperatura das pedras de gelo do teu drink. Comi sozinho enquanto você bebia acompanhada. Então se existe algum prato que se come frio, talvez você goste muito dele, só que não é pra mim. Mas ainda prefiro amor e carinho servidos bem quente. Requentado não é igual, não tem o mesmo sabor.
Nem fui eu que fiz.

Bom apetite.

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autor_jorge

não sei sonhar teus sonhos

Outra vez a gente ta voltando em carros separados. Eu sozinho, guiando o meu no caminho de casa e você aceitou a carona da sua amiga. Outra vez a gente chega de mãos dadas e vai embora querendo deletar o celular do outro da agenda. Mais uma noite que vai embora onde eu queria ter você do meu lado e você não quer me ver nem pintado de ouro. O sol vai invadir minha janela mais um dia e do lado da minha cama você não vai estar. O que me assusta é que dessa vez eu realmente prefiro que seja assim.

Não é dramatizar tudo, mas o seu descaso tem me cansado também. Eu não estou cansado de você. Só cansei dessa mão mole que você me entrega quando a gente sai pra ir ao cinema. Eu não sei o que você está se tornando, não sei se isso é ausência de choque, ausência de susto ou só a minha ausência mesmo.  Eu vou estacionar meu carro na minha garagem, você não vai precisar descer antes e ficar no sereno enquanto eu estaciono, já que a porta do passageiro não abre aqui em casa. Não vai precisar sair apertada. Não vai ter o que apertar. Não vai me ter pra te apertar. Não hoje.

Talvez amanhã a gente nem se fale, eu sei como vai ser a tua rotina. Você sabe como vai ser a minha. No final do dia eu vou estar agoniado pra te contar que aquele casal de amigos meu vão fazer aquele cruzeiro que fizemos no ano passado, só porque a gente contava com o olho brilhando de como foi bom pra nós. Que todo mundo implora pra ter uma felicidade como a nossa e você insiste em tropeçar nessa tua maturidade forçada morena. Não sei se te contaram, mas lasanha todo mundo sabe fazer. Igual a da minha avó não tem igual. Da pra comer o mesmo prato gostar de um e do outro não. Dá pra viver a mesma história e ela ser boa ou ruim. Dá pra ser feliz comigo sem julgar o que já passou. Dá também pra só me dar uma chance.

Uma chance pra que você olhe pra mim com os olhos que eu te enxergo toda manhã. Eu sou moleque e ainda tenho muita coisa pra aprender. Já vi muita coisa bonita nesse mundo, mas você sabe que igual a você eu nunca vi igual. Já fiquei te olhando dormindo milhares de vezes. Corpo encolhido, mãos fechadas para o rosto repousar. Cabelos bagunçados tentando esconder estas sardas do teu rosto, que eu detalharia perfeitamente quantas elas são.

Outra vez a gente brigou. Outra vez eu que vou correr atrás de você, não nego e nem me envergonho. Mas cada vez eu vou perdendo a força na perna. Cada vez eu to cansando mais rápido. Opostos se atraem, mas não combinam. Eles se completam, mas só quando se esforçam. Eu não sou exatamente quem você sempre sonhou, mas se você me disser tudo certinho eu realizo todos os teus sonhos como se eles fossem meus. Juro. Até pelo fato do meu sonho atual ser simplesmente te ver feliz.

2015-01-13

amor, teu relógio parou

Eu lembro bem, de quando você chegava na minha casa logo após o teu trabalho. Largava a pastas com teus papéis pendurada na cadeira. Tirava teus sapatos por ali e afrouxava a gravata antes de vir me abraçar. Eu tentava te avisar que eu estava suada da academia. Você não se importava nem um pouco de amarrotar tua roupa no meu corpo. Era impossível segurar um sorriso explodindo no meu rosto. Abraçava-me forte, me levantava e me carregava como se eu fosse uma criança pequena que não enxerga o palco.

Teve a primeira vez em que mudamos a cultura do nosso prato do jantar. Você me perguntava o que queria experimentar. Eu respondia que algo novo. Você me pegou pela mão e durante as noites de São Paulo viajamos na gastronomia do mundo todo. Você foi meu primeiro marroquino, meu primeiro francês e meu primeiro chileno. Não foi meu primeiro arrepio de mãos dadas, mas foi o melhor. Não foi nem meu primeiro puxão de cabelo na nuca que me fez revirar os olhos, mas foi o que eu pedi que durasse por mais tempo.

No meio do mar de coisas boas, eu queria que você entrasse pela minha porta e ficasse pra sempre. Você parecia entender tudo perfeitamente, até o triste fato de encontrar no meio da nossa divertida bagunça uma poltrona confortável.  Nela você sentou, ficou e se acomodou. Não sei aonde eu errei, mas não sou tola de jogar toda a culpa em ti. Mas eu tenho saudades de quando as respostas eram além de “tanto faz” ou “você que sabe”.

Eu não esqueço nenhum detalhe nosso. Eu não sei muito bem o que é amar, mas você me fazia querer tentar construir algo parecido ao seu lado todo dia. Mas mesmo sabendo que temos tantas estações diferentes no ano e na vida. Acho que você parou no inverno mesmo com o sol do verão derretendo a minha saudade de nós dois. Doí muito ver alguém partir sem saber se um dia vai voltar, é verdade. Mas o coração aperta ainda mais quando a mesma pessoa que você amou está diante dos teus olhos, sem o mesmo brilho que você.

Então, ainda meio rouca e sem coragem, eu suplico para que você levante e vá. Já não suporto mais a sua gravata alinhada, seu celular que não para e os mesmos rituais de desculpas nos teus erros. Mesmas flores, mesmo vinho, mesmo restaurante mesmo motel. Sou dessas que gosta de acostumar com o novo, não com o mesmo. O bom é sempre bom. O mesmo é sempre o mesmo. Bom com novo é muito bom, é ótimo. Bom com mesmo dá mesmo. Mesmice cansa. No bar, na conversa e na cama.

Mas tem gente que anda com o relógio no pulso parado, o ponteiro não gira e então fica acostumado a olhar o horário no celular. Um objetivo e um objeto. Eu queria estar no lugar do telefone. Mas as minhas pulseiras enroscaram no teu relógio. Meu amor, troca a minha bateria ou a tua, por favor.

Ou a gente para por aqui, igual o teu relógio, só que pro nosso bem.

autor_jorge