sem tarô, sem dor, só amor, por favor.

Tô aqui parado na frente do espelho do banheiro. Por toda a minha volta já tem arruda, pé de coelho, gato de tudo que é cor, vela de cheiro ou de quinze dias, terço, Buda e todos os outros santos que a sociedade moderna resolveu adotar para poder admirar. Já tentei rezar em todos os idiomas, talvez, tenha pedido ajuda até pra quem não tem poder. Tô apelando pra fé, se ela de alguma forma explicar como coisas que pareciam tão boas desaparecem do dia pra noite, já estará sendo bem válido. E vou esperar isso de alguma forma que não seja em palavras ou sermões, eu acreditei em absolutamente todas as coisas que eu ouvi nos últimos dias. E posso jurar que não era assim que eu me encontrava no final delas se eu as seguisse tão ao pé da letra. Por isso tá faltando um reflexo ao meu lado nesse espelho.

Descartei esperança. Agarrei firme na fé. A esperança aceita conviver com a existência da dúvida. A fé não. Apelei para os tarôs, joguei tudo que precisava e tentei ler tudo. A borra de café só me dizia que não se fazem mais safras como as de antigamente. Só não sei responder se não se fazem mais safras de cafezais ou de quem cuida dessas safras. Aliás, parece que ninguém mais cuida de nada.  Agora não sei se quem me disse isso foi o baralho exotérico ou os feijões que arremessei pela casa. Gosto do baralho pelo fato de se poder jogar com ele se nada der certo. Oras, todo mundo gosta de um bom jogo. Principalmente quando ele sai exatamente como queremos, sem sustos, sem surpresas e com o outro de cabeça baixa do outro lado da mesa. Só que não tá faltando alguém assim do outro lado da mesa assim, é porque o alguém sou eu, né?

A gente passa a vida toda esperando pra sentir uma coisa que cada um fala de um jeito. Que cada um reage de uma forma. Que uns dizem que é pra sempre, outros que duram poucos dias. Que faz a gente chorar de alegria e de dor. Que faz a gente gaguejar de felicidade e tristeza. A gente cresce sonhando em um dia amar que nem os nossos país ou avós. Que mesmo que não seja de uma forma arranjada, ele vai acontecer de alguma forma. Quando acontece a gente começa a fazer um bando de perguntas, que não tem resposta. Ou muitas vezes não queremos  que ninguém responda. Talvez pelo fato de que quando as coisas fiquem muito explicadinhas elas possam perder esse tal encanto. Pedem pra gente crer que o amor existe, mesmo que a gente não possa tocá-lo. Quando ele some, querem que a gente supere de forma natural. Vocês não entendem o que é, não conseguem explicar, mas todo mundo é pró na arte de explicar como se cura? Por favor, me poupem.

Acontece que eu cresci fazendo as coisas como mandam as pessoas. Orientei-me pelas reações que vinham nas bulas dos remédios. Chamava os mais velhos que sempre me explicavam quando eu não entendia. Quando eu era pequeno e me machucava, apontava com o indicador aonde doía pra minha mãe poder cuidar de mim. Agora eu to com o dedo apontado em riste, bem no meio do meu peito, sem remédio, sem reza e sem nada nesse mundo que o faça parar de doer. Mas quando você passa tudo fica mais leve, ou pelo menos por um tempo curto que seja eu esqueço essa dor e consigo até respirar melhor.

Eu não acho que você seja o remédio, mas acho que você sabe exatamente as doses certas dele. Sabe a intensidade necessária. Então por favor, espere eu me acostumar com cada efeito colateral. Diminua as suas doses devagar até o momento onde eu não precise mais delas para respirar. Não quero substituir amores, não quero apagar aprendizados, nem substituir lembranças. Só quero desacostumar. Pra deixar meu corpo reagir sozinho. Se ele cria anticorpos pra tanta coisa que já me fez mal, uma hora ele também vai criar alguma coisa que proteja desses amores tolos que passaram por aqui.

Não é um amor que cura outro. Não é um remédio que substitui o outro. Não se troca de santo pra trocar de causa. O amor maior tem que ser o próprio, remédio bom é aquele que faz a gente viver sem ele depois do tratamento. E ao invés de trocar de santo pra pedir, agradecer por tudo que eles já fizeram ajuda bastante.

Sem tarô, sem dor, só amor, por favor.

autor_jorge

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