Desligou tudo. Fechou a bolsa e levantou rapidamente da sua mesa. Tão rápido que teve que ajeitar um pouco a saia. Se despediu das amigas e se desculpou por não conseguir ir mais tarde. No caminho ouviu sua banda favorita da época de colégio. Sozinha no transito ao som do passado. A chuva a fez fechar os vidros do carro. O que foi quase o abrir das cortinas. Entre as janelas daquele carro, sem culpa de qualquer julgamento ela cantava. O telefone tocou. Parou a música no refrão e então o atendeu. Ele atrasaria um pouco pelo trânsito. Ela comemorou pelos preciosos minutos de atenção que ele entregou para que ela pudesse escolher as roupas. Respondeu num tom de tranquilidade e brincou com a falta de pontualidade dele. Ele disse que isso nunca acontecia. Ela sorriu e concordou. Ele vinha mais tarde.
Ele se acomodou no banco do carro. As obras na cidade fecharam todas suas alternativas ate a casa dela. Aproveitou o anda-para dos carros pra colocar as conversas pela metade em dia. O beijo de sábado e o cinema de domingo. O conselho amigo da quinta passada. A amiga que desesperada não sabia como chamar a atenção do veterano da faculdade. E resolveu voltar nas fotos da época em que ele tinha uma história com quem iria encontrar mais tarde. A viagem que ninguém lembra. O churrasco da faculdade. O último abraço e o último copo dividido pelos dois. Dividido por uma dúvida que o gelava por dentro como quando a primeira noite que parou na frente da casa dela. Seguro por todas as vezes em que ela lhe foi uma boa companhia. Contou uma piada deles pro retrovisor e riu sozinho. Ultrapassou três carros e encostou pra encontrar um vinho que queria que ela experimentasse. Saudade diferente dela. Quando ela se foi nunca doeu nele. Ela era diferente e no fundo ele sempre soube que ela ia voltar.
Ela já corre pela casa vestida pra ele. Num meio termo de que podem sair para comer algo simples e rápido para fugir do frio. Mesclado com algo que possa passar o resto da noite ali mesmo. Apenas no sofá, um filme, a risada dele e uma pizza. O vinho que ele levava era um convite pra ficar. Mas poderia ser o início de uma conversa na madrugada. Poderia ser a primeira peça da roupa dela que ele fosse tirar. Não sabia se descia com a garrafa ou a chamava pra descer. Procrastinou sua dúvida até a porta dela. Ela terminava o primeiro olho quando o celular tocou. Perguntava se ela estava pronta. Ela respondeu quase. O interfone tocou e ele subiu. Ela deixou a porta aberta e pediu pra ele aguardar. Com a garrafa no braço ele a esperava na varanda. Ela leve e linda. Ele sério e um pouco confuso. Abraço meio sem jeito. Ela como sempre foi. Ele parecia mais velho. Perguntaram se estavam bem ao mesmo tempo. Sorriram. Pareciam mais jovens. Talvez um deixasse o outro mais novo. Como era bom encontrar o sorriso dela. Como eram seguros os olhos dele. Como era mágico como nunca foram previsíveis um com o outro.
Sentados no sofá, tropeçando nas palavras pois não sabiam onde tinha parado seu último assunto. Não pararam de se falar. Apenas deixaram. Acomodaram e seguiram em seus respectivos caminhos. Ela tinha mudado de emprego e colecionava mais uma promoção no novo trabalho. Ele tinha deixado aqueles olhos esverdeados que um dia chamou de amor. O trabalho que já não o fazia feliz mas tinha lhe ensinado tudo tinha sido deixado também. Agora por conta própria cuidava dos seus clientes e dos seus horários. Ele soltou como sempre quis. Ela solta como sempre foi. A pizza acabou. O casaco já repousava na cadeira e o vinho resolveu fazer efeito. Química e vinho são a matéria prima para que o tempo acelere. Logo ia acabar. A televisão foi aos poucos perdendo a atenção. O celular ficando sem sinal. O melhor lugar do mundo naquele horário era ali. Melhor ter foco (…)
(…)
acordou com outro despertador. Vinte minutos antes do seu diário. Era o barulho do chuveiro banhando o corpo dela. O toque foi do sol que escapou pela cortina pela fresta que o vendo fez. Dois emails não lidos era o que o celular acusava. Algumas mensagens não respondidas também. Confirmou a reunião pouco depois do almoço e o jantar com a morena do final de semana passado. Vestiu o casaco e algumas lembranças. Cruzou com ela no corredor. Toalha na cabeça e o corpo vestido da seriedade do dia que começava. Trocaram um bom dia. Queriam trocar os perfumes. Ele preparou um suco para dois copos e um pão com queijo que acabou comendo só. Desceram para os respectivos carros e reviveram o abraço sem jeito da noite anterior. Um pouco mais encaixado do que outro. Entrelaçou os dedos nos cabelos dela e agradeceu pela noite. Ela acariciava levemente a tatuagem dele na costela e respondia apenas com um suspiro de que ele sempre trazia uma paz. Ligaram seus carros e buzinaram cordialmente um pro outro.
Era mais um dia bom.
(…) onde guardaram um segredo que ninguém saberia pra nunca deixar de ser um. Ninguém estraga o que ninguém sabe. Por isso o mundo ainda é mais interessante offline.